Efemérides 30 de Novembro
Geoffrey Household (1900 – 1988)
Geoffrey Edward West Household nasce em Bristol, Inglaterra. Formado em Literatura Inglesa, trabalha em diferentes profissões em vários locais: Roménia, Espanha, Estados Unidos, Médio Oriente, América do Sul. Durante a 2ª guerra mundial pertence à British Intelligence. Começa a escrever nos anos 20 e o seu primeiro romance, The Terror Of Villadonga, é publicado em 1936. Escreve principalmente trillers, por vezes com uma atmosfera de sobrenatural ou ficção científica. Publica no total 7 colectânea de short stories e 28 romances, alguns dos quais protagonizados por Raymond Ingelram ou Roger Taine. O seu livro mais conhecido é Rogue Male (1939), um thiller clássico. Em Portugal estão editados os seguinte policiários de Geoffrey Household:
1 – A Caravana Da Morte (1972) Nº67 Colecção Espionagem, Editora Dêagá. Título Original: Doom’s Caravan (1971).
2 – A Fera Solitária E O Ditador (1977) Nº1 Colecção Águia, Editora Perspectivas & Realidades. Título Original: Rogue Male (1939). Reeditado em 1986 pelo Círculo de Leitores com o título A Fera Solitária.
3 – Refém - Londres : O Diário De Julian Despard (1982) Colecção Ficções, Moraes Editores. Título Original: Hostage London — The Diary Of Julian Despard (1977).
4 – Justiça Feroz (1987), Círculo de Leitores. Título Original: Rogue Justice (1982). É a sequência de Rogue Male.
John Dickson Carr (1906 – 1977)
Nasce em Uniontown, Pennsylvania. EUA. Considerado um dos grandes escritores clássicos do policiário, é sem sombra de dúvida o mestre do “mistério de quarto fechado” (ver TEMA). Escreve sob os pseudónimos literários Carter Dickson, Carr Dickson e Roger Fairbairn. Autor com uma vasta obra, destacam-se os 45 romances publicados como Jonh Dickson Carr com os personagens Henri Becolin, Patrick Butker e Dr. Gideon Fell; 26 livros sob o pseudónimo Carter Dickson protagonizados por Sir Henry Merrivale: 4 colectâneas de contos e 1 livro de peças para rádio. John Dickson Carr é ainda biógrafo de sobre Sir Arthur Conan Doyle O livro The Three Coffins (também editado com o título The Hollow Man) / Os Três Ataúdes é encarado como a obra prima do escritor e o um dos melhores romances do escritor. Em Portugal estão editados vários livros de John Dickson Carr / Carter Dickson, que serão apresentados futuramente.
Nasce em Cincinnati, Ohio, EUA. Escritor de policiários considerados como “quase góticos” e ênfase para o factor psicológico (ver TEMA). Em Portugal estão editados:
1 – O Fim De Philip Banter (1994) Nº2 Colecção Lua Cheia, Editora Terramar. Título Original: The Last Of Philip Banter (1947).
2 – Que O Diabo Leve A Mosca Azul (2009) Nº21 Colecção Crime Imperfeito, Editora Relógio d’Água. Título Original: The Devil Take The Blue-Tail Fly (1948).
TEMA — ESTUDOS DE LITERATURA POLICIÁRIA — CARR E OS MISTÉRIOS DE QUARTO FECHADO
Por M. Constantino
O essencial da “narrativa-problema”, dita clássica ou “novela de enigma” constrói-se sob a falsa aparência onde tudo se conjuga para enganar os olhos e induzir a razão em erro. E só no momento último a realidade retoma os seus direitos e revela a face escondida das coisas, ainda que valha a verdade, o critério narrativo máximo nada se escondia do leitor que era implicitamente desafiado a competir com a inteligência da própria narração. John Dickson Carr, em nome próprio ou sob os pseudónimos Carter Dickson e Roger Fairbairn (diz-se para aliviar a prolífica produção), conferiu-lhe uma nova dimensão caracterizada no tema fascinante do “crime em sala fechada” — entre nós “crime em quarto fechado” — o que, sem contestação possível, é a situação mais alta para pôr em prática e explorar um enredo baseado, fundamentalmente, em raro engenho.
Na sua primeira narração, It Walks By Night (1930) propõe-nos este cenário:
O assassino não está escondido. Não há possibilidade alguma de paredes falsas, do tecto ao solo. Não havia entradas secretas. O assassino não se encontrava em nenhum lugar do quarto, não havia escapado pela janela, não havia saído pela porta e, sem dúvida havia decapitado a sua vítima dentro daquele mesmo quarto. Sabíamos de ciência certa que o morto não se havia suicidado.
Este é o problema que se depara ao detective amador Henri Bencolin, primeiro personagem criado por Carr — um juiz francês, alto e delgado, musculoso, barba e bigode onde espreita um cachimbo fumegante. Mas perguntará o leitor: porquê um crime em quarto fechado, que só pode ser para o seu praticante, de alto risco? Que razões levam um assassino a tentar inventar um plano tão complexo? Um outro personagem de Carr, o Doutor Gideon Fell — retratado fisicamente como uma cópia de G. K. Chesterton, um homem forte, muito forte, de óculos presos por uma cinta negra encavalitados num proeminente nariz, rosto corado e com bigode de bandido antigo, grossa papada, desalinhado no vestir, amparado num bastão-muleta, imaginou três explicações possíveis:
- Não estava nas intenções do culpado colocar à polícia um enigma insolúvel, apenas as circunstâncias do decorrer da acção criaram o enigma acidentalmente;
- O plano do assassino consistia em fazer crer uma tese de suicídio;
- O assassino quis que se acreditasse na intervenção de elementos sobrenaturais.
Agora perguntamos nós, essas razões interessam?
É que a estrutura da narrativa é apenas técnica, na época em evidência não havia lugar para a dimensão humana, os autores relegavam para segundo plano qualquer vislumbrem de paixão, amor ou ódio, virtudes ou vinganças. Hã que explorar a temática pelo fascínio que em si representa o “crime impossível ou em quarto fechado”. Não nasceu o conto ou novela policiária sob o signo do “crime em quarto fechado” ainda que sem assassino humano no Assassinato da Rua Morgue?
Sabemos que a técnica se põe em três momentos:
- O Crime foi cometido antes de o quarto ser fechado;
- O Crime foi cometido enquanto o quarto era fechado;
- O Crime foi cometido depois de o quarto ser fechado.
O Doutor Fell já referenciado, oferece-nos em The Three Coffins uma interessante prelecção sobre os métodos possíveis de assassinato em “quarto fechado” e as suas possíveis soluções segundo sete classificações diferentes e algumas sub-divisões. Nas suas dezenas de livros, Carr / Dickson recorre com surpreendente facilidade a “improváveis possibilidades” que o leitor considera impossíveis para acabar por se render à explicação, já que a ilusão do prestidigitador é maravilhosamente inteligente.
Um outro personagem volumoso, Sir Henry Merrivale, também identificado por H.M., destacado por alguns críticos como cópia da figura do histórico Winston Churchill, é um nobre baronete mais antigo da Inglaterra, que além de gordo e calvo, pontifica a sua actuação por um rosário de imprecações e palavreado grosseiro, com uma inteligência e lógica de raciocínio que usa para resolver os mais difíceis casos criminosos, quer de crimes impossíveis em quarto fechado, quer de outra espécie.
TEMA — ESTUDOS DE LITERATURA POLICIÁRIA — BARDIN E O FACTOR PSICOLÓGICO
Por M. Constantino
Quando nos anos 30 do anterior século, a narrativa criminal tentou afastar-se da então dominante novela clássica ou de enigma, tal como foi fundada por Poe, iniciou-se uma progressiva trajectória com tendências que observavam os elementos psicológicos sob distintivas prespectivas. Foi o escritor Anthony Berkeley Cox (Clicar) debaixo do pseudónimo de Frances Iles — que se tornou famoso em Malice Aforethought (1931) / Malícia Premeditada — o primeiro a explorar as sensações que o assassino e a vítima podem experimentar em situações reais ou imaginárias, angústias, tensões vividas. Mais tarde, em Before The Fact (1932) / Suspeita, igualmente uma profunda investigação psicológica. O factor psicológico do crime revelou-se desde então como uma nova possibilidade da narrativa policiária ou criminal que alguns escritores acolheram favoravelmente e utilizaram o sub-género em referência.
John Franklin Bardin, nos anos quarenta acercou-se também à tendência psicológica do género criminal. E fê-lo de um modo totalmente original porque as suas obras (3 apenas) transcendiam, por vezes, o mundo da realidade autêntica e objectiva, para fixá-la como uma realidade subjectiva e imaginada, criando deste modo situações de angústia indiscritível.
No seu tempo Bardin foi incompreendido pelo público que, por tal, não chegou a captar o interesse da fantasia psi qcológica da sua obra, não obteve êxito e foi esquecido.
Ante o fracasso, Bardin deixou de escrever sob o seu nome, tão só sob os pseudónimos de Gregory Tree e Douglas Ashe continuou na literatura policiária, sendo o criador dos detectives Bill Bradley e Noel Mayberry.
Coube a Julian Symons (Clicar), escritor, investigador e historiador redescobrir Bardin e sustentar os esforços na republicação daquelas três obras em 1976: The Deadly Percheron, The Last of Philip Banter e Devil Take the Blue-Tail Fly que finalmente o consagram como um importante escritor.
John Dickson Carr |
John Franklin Bardin |
TEMA — CONTO POLICIÁRIO DE BEN WILSON — À PROVA DE BALA
O sol estava no zénite, de maneira que Michael Wren não encontrou uma sombra sequer em qualquer dos dois lados de Mechanic Street. Lançava olhares invejosos aos transeuntes que encontrava em mangas de camisa e chegou mesmo a desabotoar casaco, mas pensando melhor, desistiu.
Foi ao dobrar da esquina, entrando em Cartland Street que notou, pela primeira vez, o homen que o seguia.
Michael acelerou o passo pela travessa que leva a Michigan Avenue, e olhando rapidamente para trás, constatou que o homem também entrara na travessa.
Michael entrou numa loja de “nada além de 10 cêntimos”, atravessou-a de extremo a extremo e saiu em Michigan Avenue.
Mas não conseguiu despistar o homem, pois quando saiu do outro lado o sujeito continuava atrás dele.
Sem se deter, Michael entregou um níquel ao jornaleiro e tirou a última edição do “Citizen-Patriot”. Era uma edição extra que, em grande manchete, anunciava tudo quanto Michael queria saber: “UM ASSASSINO FOGE DA PRISÃO”.
Havia um retrato do prisioneiro que fugira. Michael não precisava de examinar com muita atenção para saber que o original daquele retrato estava no meio da multidão, atrás dele.
— Granvy! — exclamou Michael.
Atravessou a rua quase correndo, sem esperar que o sinal abrisse para os peões, e entrou como uma flecha na porta giratória do hotel.
O quadro que, na portaria anunciava as actividades sociais da semana dizia: “Hoje Almoço do Executive Club —Orador convidado, Detetive Michael Wren”.
Michael passou pelos elevadores e subiu a larga escadaria, de três em três degraus.
— Bonito — murmurou — Eu sem revólver, e sem tempo para arranjar um!
No segundo piso, atravessou um vestíbulo e abriu uma porta. O murmúrio da conversação de quarenta ou cinquenta homens podia ser ouvido entre o barulho dos talheres Michael fechou a porta de novo.
— Não devo expô-los àquele louco — pensou — É melhor ficar aqui fora.
Atirou o jornal para uma cadeira e, quando o jornal caiu aberto, uma frase sobre a fuga do criminoso ficou sob seus olhos: “Foi o trabalho do hábil detective Michael Wren que permitiu a condenação de Granvy em Outubro de 1936” E Michael ouviu de novo a voz rude de Granvy no tribunal:
— Hei de apanhá-lo, Wren. Hei de apanhá-lo, verá.
O silenciador da pistola automático 38 nas mãosl de Granvy dava à arma um aspecto estranho, surrealista. Michael afastou os olhos da ameaça da arma, e fitou o rosto comprido de Granvy.
— Sim! Olhe bem para mim! — exclamou Granvy. — Eu, com esta cara de barriga de peixe, e você, com toda essa saúde, estamos frente a frente. E quem vai sair a perder é você.
Michael viu o movimento quase imperceptível da arma.
— Chegou — pensou Michael — Meu Deus, que não seja na cabeça!
— Toma chui — gritou Granvy, com o rosto lívido.
Saíram seis “tiques” da arma silenciosa, seis tiros, que atiraram o detective de encontro à parede.
Um homem enfiou a cabeça pela porta da sala de jantar.
— Ah! O senhor está aí, Mr. Wren? — disse — Já estamos prontos.
Voltou para a saia, deixando a porta aberta.
Michael afastou-se da parede e meteu a mão no bolso. Em poucos momentos Granvy estava algemado.
O assassino olhava, bestificado, para as algemas e para a pistola que Michael arrancara das suas mãos.
A voz nasalada de um homem no salão do almoço anunciou:
— E, agora, tenho o prazer de apresentar o grande detective Michael Wren. Veremos Harry James fazer fogo contra ele. Mr. Wren vai-nos apresentar uma demonstração de um colete à prova de bala, da sua invenção.