24 de novembro de 2012

CALEIDOSCÓPIO 329

Efemérides 24 de Novembro
William F. Buckley Jr.(1925 - 2008)
William Frank Buckley, Jr. nasce em New York City, EUA. Político conservador, editor, comentador de radio e televisão e autor de livros sobre política é também escritor de policiários, em grande parte bestsellers de espionagem. Cria a série Blackford Oakes, um espião da CIA que surge pela primeira vez em Saving The Queen, e é protagonista de 12 livros editados entre 1976 e 2005. Além destes, o autor escreve ainda mais 10 romances policiários. Em Portugal está editado:
1 – O Homem de Berlim (1987), Nº49 Livros de Bolso, Série Guerra e Espionagem, Publicações Europa-América. Título Original: The Story Of Henry Tod (1984). É o 5º livro da série Blackford Oakes.





TEMA — CRÓNICA — HONRA NÃO É VENTO!
Por M. Constantino
Não há muito tempo, a Lei exigia ao depoente o compromisso de honra:
Juro perante Deus dizer a verdade, só a verdade, nada mais que a verdade.
E a palavra era de tal forma vinculada que era tida como profissão do devedor o que se recusasse a prestar juramento sobre a invocada dívida (art.ºº 314 C.C.). Nesses tempos e de longa data anterior, um aperto de mãos selava um compromisso como se de escrito notarial se tratasse. A palavra de honra era sinónimo de probidade para todo e qualquer cidadão. Honra, sempre foi a mais-valia sem preço.
Após 74 foi alterado o juramento de “perante Deus” para “Juro por minha honra”. Hoje, juramento e honra jazem no alvido. Será que se reconhece o mérito ao velho aforismo dos namorados? “Quanto mais juras mais mentes. De facto e, não só entre namorados, a mentira tomou foro. Ouvir um juramento é colocar-se-mos uma dúvida… Costumava dizer-se: “perder dinheiro é muito, perder a honra é tudo'”, hoje, diz-se: “é o dinheiro que sustenta a honra”. William Shakespeare não tinha em grande apreço a honra quando em Henrique IV, escreve: “O que a honra? Uma palavra. O que essa palavra contém? Vento!”.
Talvez sejam verdadeiras as três citações, depende de quem interpreta: se nada significa para uns, é essencial para outros. Mas Shakespeare enganava-se: honra não é vento. A honra é um direito de personalidade: surge no homem pelo simples facto do nascimento, afirma-se ao longo da vida pelas qualidades morais que adquire na sociedade. E identifica-se por si própria. Ultrapassa o património moral e fixa-se no Ordenamento Constitucional catalogada no art.º 26 nº 1 entre os direitos pessoais de qualquer cidadão, o direito ao bom nome a reputação, isto é, o direito de não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social.
A honra não é uma palavra de Retórica, existe, como se viu, juridicamente protegida e moralmente relevante como sentimento.
Para além do que se disse, a palavra honra e a própria honra, existem em realidade? Com certeza que existem. Vivemos, é certo, numa época em que tudo parece correr ao sabor da ventania e os próprios espíritos são impelidos pelos ventos mais opostos. neles, como folhas secas outonais volteiam critérios, doutrinas, conjuntos de valores que serviram de sustentáculo a uma civilização. Neste período contemporâneo, deixaram de existir pontos referenciais constantes; tudo é mutável — uns chamam-lhe liberdade, outros progresso. Mas a sensação de liberdade que conduz à ausência de regras, confundindo--se com permissividade, isto é, liberdade sem destino, é irresponsável. Não há verdadeira liberdade sem consciência. Nesta está implícita um juízo de valor que pressupõe um julgamento baseado no sentimento racional. Nestes tempos de desintegração de valores, que são uma evidência, a honra é uma lacuna sentida. Lemos centenas de jornais sem a encontrar em letra de forma, se bem que tanto bastaria a sua constatação efectiva. Clamam os entendidos que a liberdade é a mãe de todos os valores. Aceitemos, mas o caminho a percorrer é olhar para dentro de nós mesmos a fim de redescobrirmos a verdade renascida, a Fénix da liberdade e dos valores, integrando-os no novo espírito do ser humano. Mais do que glórias que são passageiras, dos bens materiais que não compram honestidade, o homem precisa de sentimentos de honra que são apanágio de personalidades verdadeiramente grandes.



TEMA — CONTO DEDUTIVO DE ISAAC ASIMOV — EXAME DE RACIOCÍNIO
Desafio: confronte a sua sagacidade com a de Hal Kempe.

O Professor Neddring olhava com benevolência para o seu aluno recém-formado. O rapaz ali estava sentado à vontade: tinha o cabelo um tanto avermelhado, os olhos vivos, mas calmos e as mãos metidas nos bolsos da bata de laboratório. Indiscutivelmente um espécime do futuro, pensou o professor
Ele já sabia há algum tempo que o rapaz estava interessado na sua filha. E o que mais importava, já sabia há algum tempo que a filha estava interessada no rapaz.
— Vamos acertar isso — disse o professor. — Você veio pedir a minha aprovação antes de propor casamento à minha filha?
— Sim senhor — disse Hal Kempe
— É evidente que não estou a par das últimas manias da juventude… na certeza não há de ser esta a nova onda — o professor meteu as mão nos bolsos e reclinou-se para trás na cadeira — Hoje em dia a rapaziada não e muito de pedir licença, não é verdade? Não me diga que vai desistir minha filha se eu o rejeitar?
— Não, se ela ainda me quiser, não vou, e acho que ela me quer. Mas seria bom…
— … se tivesse a minha aprovação. Porquê?
— Por razões muito práticas — disse Hal — Eu ainda não tenho o meu título de doutor, e não quero que digam por aí que estou a namorara sua filha para o obter. Se o senhor achar que estou, diga logo, que talvez eu espere até depois de ter o título. Ou talvez não espere, arriscando que a sua desaprovação velha a dificultar-me bastante a obtenção desse título.
— Portanto, por amor ao doutoramento, acha que seria aconselhável que estivéssemos de acordo em relação a seu casamento com Janice
— Sim professor, para lhe ser franco.
Houve um silêncio entre eles. O Professor Neddring pensava no assunto com certo mal-estar. Durante alguns anos no seu trabalho pesquisa ocupava-se de complexos de crómio, e tinha grande dificuldade em pensar com certa precisão, sobe assunto tão imprecisos como afeição e casamento.
Esfregou o rosto escanhoado — com a idade de cinquenta anos, sentia-se velho demais para os diversos estilos de barba exibidos pelos membros mais jovens do departamento, e disse:
— Bem, Hal, se você quer uma decisão de minha parte, terei de baseá-la em alguma coisa, e a única maneira que tenho de julgar pessoas é através de seu poder de raciocínio. A minha filha julga-o à moda dela, mas eu terei de julgá-lo à minha.
O professor inclinou-se para a frente, rabiscou algo num pedaço de papel e disse:
— Diga-me o que quer dizer isto, e terá minha bênção.
Hal pegou no papel. O que estava escrito era uma série de números:
6922304520372625435627
— Um criptograma? — disse
 — Pode chamá-lo assim.
Hal franziu ligeiramente, a testa.
— O senhor quer dizer que deseja que eu resolva um criptograma, e, se conseguir resolvê-lo, o senhor aprovará o casamento?
— Sim
— E se não conseguir, então o senhor não aprovará o casamento?
— Pode achar trivial, admito, mas é esse o meu critério. Seja como for, poderá casar com Janice sem minha aprovação. Janice e maior de idade.
Hal sacudiu a cabeça.
— Mesmo assim, preferia ter sua aprovação. De quanto tempo disponho?
— De nenhum. Diga-me agora o que significa. Raciocine.
— Agora?
O professor assentiu.
Hal Kemp remexeu-se na cadeira e contemplou a fila de números na sua mão.
— Tenho de fazê-lo de cabeça? Ou posso usar lápis e papel?
— Faça-o, apenas. Fale. Quero ouvir como raciocina. Quem sabe? Se gostar do seu modo de raciocinar, poderei dar-lhe a minha aprovação mesmo que não o resolva.
— Bem, está certo— disse Hal certo—É um desafio. Em primeiro lugar, partirei de um pressuposto. Pressuponho que o senhor seja um homem honrado, e não me colocaria um problema sabendo de antemão que eu não o poderia resolver. Portanto este é um criptograma que, em sua opinião poderei resolver sentado nesta cadeira e quase de improviso. O que por sua vez significa que ele contém algo que eu conheço bem-
— Isso parece-me lógico — concordou o professor.
Hal, porém, não o estava a ouvir, parecia decidido.
— Conheço bem o alfabeto, naturalmente, portanto poderia ser uma cifre de substituição comum… números por letras. Presumo que se fosse isso, haveria de conter alguma subtileza, ou seria fácil demais. Mas sou amador nesse tipo de coisa, e, a não ser que eu visse logo um plano característico nos números que desse um significado ao conjunto, ou estaria perdido. Noto que há três 6, seis 2 e nem um só 8, mas isso nada significa para mim. Assim, abandono a possibilidade de uma cifra generalizada e mudarei para o nosso ramo.
Continuou:
— O seu ramo especializado, professor é a química inorgânica e decerto é também o meu. E, para qualquer químico, os números dão logo a ideia de números atómicos. Cada elemento tem o seu próprio número e há cento e quatro elementos conhecidos hoje em dia; portanto, os números em questão iriam de 1 a 104. O senhor não indicou como é que os números estão divididos. Há números atómicos de um algarismo de 1 a 9; os de dois algarismo de 10 a 99 e os de três algarismos de 100 a104. Tudo isso é óbvio, professor, mas o senhor quis ouvir o meu raciocínio, logo estou a expô-lo por completo.
Podemos esquecer os números atómicos de três algarismos, já que o 1 é necessário e no criptograma não há um único 1. Como o senhor me deu vinte e dois algarismos ao todo, há uma possibilidade de que somente números atómicos de dois algarismos estejam incluídos — onze deles. Poderia haver dez de dois algarismos e dois de um algarismo, mas duvido. Até a presença de dois números atómicos de um algarismo poderia resultar em centenas de combinações diferentes de lugares nesta lista, e isso certamente dificultaria demais as coisas para uma solução imediata ou mesmo rápida. Parece-me que tenho onze números de dois algarismos e, assim, poderemos mudar a mensagem para
69 22 30 45 20 37 26 25 43 56 27
Estes números por si só parecem não dizer nada, mas se forem números atómicos, porque não convertê-los nos nomes dos elementos que os representam? Os nomes poderiam ter algum significado. Isso de improviso, não é tão fácil, porque não tenho de cor a lista dos elementos na ordem dos seus números atómicos. Posso procurar numa tabela?
O professor ouvia com interesse.
— Eu não procurei nada quando preparei o criptograma.
— Está certo então. Vejamos — disse Hal devagar — Alguns são óbvios. Eu sei que 30 é o zinco, 20 é o cálcio, 26 é o ferro e 27 é o cobalto. Quanto ao 43, isso é por perto da prata, que é o 47. Isso significa paládio, ródio, rutênio, tecnécio, diria que é tecnécio. Os outros são elementos raros na terá e nunca consigo acertar. Vejamos… vejamos… Está certo. Acho que já sei.
Escreveu rapidamente e disse:
— A lista dos onze elementos da sua relação é túlio, titânio, zinco, ródio, cálcio, rubídio, ferro, manganês, tecnécio, bário, cobalto. Está certo? Não, não responda.
Estudou a lista atentamente.
— Não vejo relação entre esses elementos, nada que me parece dar uma pista. Passemos adiante, então e examinemos se há algo, além do número atómico, que seja tão característico nos elementos, que salte logo aos olhos de qualquer químico. Evidentemente seria o símbolo químico… a abreviatura de uma ou duas letras de cada elemento, que se torna a segunda natureza de qualquer químico. Neste caso, a lista dos símbolos químicos é… — escreveu novamente —
 Tm, Ti, Zn, Rh, Ca, Rb, Fe, Mn, Tc, Ba, Co.
Poderíamos tentar formar uma palavra ou frase, mas não formam, não é? Portanto teria de ser um pouco mais subtil do que isso. Se fizermos um acróstico com as letars e escolher apenas as primeiras letras, de nada adianta. Logo, vamos tentar as segundas letras de cada símbolo, em ordem, temos: “minhabencao” —
 minha bênção. Suponho que seja essa a solução professor.
— É — disse o Professor Neddring — Você teve um raciocínio perfeito e merece a minha permissão para propor casamento à minha filha, conforme combinámos.
Hal levantou-se, virou-se para se ir embora, hesitou e depois voltou.
— Por outro lado — não gosto de ter fama do que não fiz. O raciocínio que empreguei pode ter sido exacto, mas eu apenas apresentei porque queria que me ouvisse raciocinar com lógica. Na verdade eu sabia a resposta antes de começar, portanto, de certo modo, enganei-o e tenho de confessar.
— Ah é? Como?
— Bem sei que o senhor me tem em boa conta, imaginei que queria que eu acertasse na solução e não resistiria a dar-me uma pista. O senhor disse-me ao entregar o criptograma: “Diga o que quer dizer isso e terá a minha bênção”. Calculei que poderia quer dizer literalmente isso. “Minha bênção” tem 11 letras e o senhor entregou-me 22 algarismos. Reduzi-os imediatamente a onze. Depois, também lhe disse que não sabia de cor a lista dos elementos. Os poucos que sabia bastavam-me para me mostrar que as segundas letras dos símbolos formavam “minha bênção”, portanto deduzi os restantes entre os elementos que tinham nos seus símbolos as letras que convinham. Ainda mereço?
O professor Neddring sorriu, afinal.
— Agora, meu filho, — disse — você merece realmente. Qualquer cientista competente consegue pensar com lógica. Só os grandes empregam a intuição.



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