10 de novembro de 2012

CALEIDOSCÓPIO 315

Efemérides 10 de Novembro
Jason Pinter (1979)
Nasce em Nova Iorque, EUA. Trabalha durante 5 anos como editor antes de se dedicar em exclusivo à escrita. Publica o seu primeiro livro — que se revelaria um sucesso — em 2007, The Mark, com que inicia também a série Henry Parker, um jovem jornalista. Jason Pinter é actualmente um autor de bestesellers, está traduzido em várias línguas e tem sido nomeado para os mais conceituados prémios de literatura policiária: Thriller Award, Strand Critics Award, Shamus Award, Barry Award, CrimeSpree Award e RT Booklovers Reviewers Choice Award. Na série Henry Parker estão também editados The Guilty (2008), The Stolen (2008), The Fury (2009), The Darkness (2010), The Invited (2010). Em 2011, Jason Pinter publica uma série nova para jovens Zeke Bartholomew: Superspy.




TEMA — CRÓNICA SOCIAL — A FORÇA DO DESTINO NO DESTINO DO HOMEM
Por M. Constantino
A cada passo ouvimos e, cada um de nós sente por vezes, que nada podemos contra o Destino ou, o que se convencionou chamar Destino. É o fatalismo, o irremediável com que Zeus, o Deus supremo da mitologia grega castigou Agamenon e através deste toda a Humanidade… é o fado da fatalidade na voz pungente do fadista “quando nasce uma pessoa, trás o destino traçado”… é a palavra-choque que mais se tem usado e abusado nos filmes hollywoodescos exclusivamente conotados com a catástrofe, o inevitável, tragédia secreta, ruína irremediável, que lhes confere um sabor e um arrepio de arrebatamento que liga o espectador ao enredo… é tudo isso e muito mais o que exprime de forma popular a cultura história da incapacidade humana de dominar os acontecimentos da vida e de os construir por si própria.
Não podemos negar um destino, pelo menos um, o genético, expresso nas características físicas, como a cor dos olhos ou a raça. Esta acepção a conter-se na famosa frase de Freud: “anatomia é destino”. Na determinação da vida seria erro doentio, autopunição ou masoquismo, admitir que só podemos viver nos limites e segundo um plano ou desígnio prévio. É verdade que não podemos dominar um terramoto, um vulcão ou outro fenómeno natural, exactamente porque são naturais e se produziriam quer existíssemos ou não… não nos é endereçado especificamente pelo destino, do mesmo modo que em vez de negativismo de uma catástrofe podemos estar num lado positivo de um outro cenário… a felicidade de aspirar ar puro da praia ou no campo, um encontro de amor. Ainda que por definição intrínseca quiséssemos a existência de um destino como objectivo limitado, é sempre na confrontação desses limites que emerge a criatividade e vontade humana. O grande potencial emocional da liberdade do ser humano deriva do facto de que a vida humana e até mesmo a busca da felicidade dependem da natureza da eficiência e força da vontade que lhe proporciona lutar por um sentido da vida, mesmo que encontre escolhas ou oposição de outros seres humanos. E se o resultado foi contrário ao pretendido é meramente circunstancial, algo falhou no encaixe ou cálculo dos factores de provisão: o destino não interferiu, mas o Homem, Marco Aurélio, o estóico romano, no período em que o Destino era um deus mitológico assustador tinha em mente que “o destino atribuído a cada homem lhe convém e faz com que seja conveniente a si mesmo”. Reconhecer a força do destino é cobarde mas cómodo. Na mesma linha e definiu Romain Rolland ao salientar que “os homens inventaram o destino a fim de lhe atribuírem as desordens do Universo que eles têm por dever governar”. Em verdade, o homem não se deve quedar pela pergunta “Que irá acontecer?”, mas reagir, “Que posso eu fazer?” A filosofia tem dado asas à especulação, mas também à reflexão. A questão resume-se, hoje, em reconhecer que se não somos senhores da vida e da morte, postos diante do milagre da vida, ternos livre arbítrio para decidir como usá-la. Somos, para o bem e para o mal, donos e responsáveis pela sua realização.


TEMA — CONTO POLICIÁRIO DE STEPHEN BARR — O GUINÉU PERDIDO
Nunca ouvi falar dele — disse Finlay com o ar de quem desarma comentários. — Não se encontra em nenhum catálogo que me tenha passado pelas mãos. Olhou de viés para a pesada moeda de ouro em cima da mesa de jantar, e tomou um gole do vinho do Porto de 88. — E não existe menção alguma do incidente nos livros de história. Disso estou certo.
— O galante Príncipe Charlie — disse o anfitrião, Alistair de Mar — não nadava em dinheiro. E planeava inundar a Inglaterra com moedas falsas, o que teria embaraçado a administração de Walpole. Isso foi em 1745, antes de desembarcar na Escócia, e um gravador francês fez os moldes, Os guinéus seriam cunhados em metal, provavelmente pechisbeque. Porém este único exemplar foi cunhado em ouro, e o jovem Pretendente guardou-o como lembrança. Os moldes foram destruídos e o plano jamais foi descoberto: creio que não lhe agradou ser conhecido como moedeiro. O guinéu está na minha família desde o século XVIII.
Alistair de Mar apanhou-o e entregou-o a Wilson, que o observou atentamente.
— É única — continuou de Mar. Sir John Dyer ofereceu-me dez mil libras por ela, porém respondi-lhe que dez mil libras eu tinha e ninguém mais possui uma moeda como esta.
— Mas…
Wilson calou-se e largou a moeda em cima da mesa, sacudindo a cabeça.
O seu vizinho, o Coronel Wragg, pegou nela.
— Não entendo muito destas coisas. A minha especialidade é o dinheiro oriental. Porém parece George II. — Franzia o cenho.
— Vêem-se folhas do touro em demasia na coroa — disse Alistair de Mar. — E a data encontra-se fora do centro. Para mim o retrato assemelha-se mais aos Bourbons do que os Hanoverianos. Mostre-o a Sutro e vejamos qual a sua opinião.
Sutro era escultor. Assentiu diversas vezes ao estudar a moeda:
— Sim, lembra o Luís XIV de Rigaud. Porém é muito sóbrio.
Colocou a moeda de lado.
O único de entre os seis homens que não se manifestara era Powys, professor de etnologia em Cambridge. Sorriu e depois falou num fio de voz:
— A realeza europeia guarda traços comuns a todos, pois sempre houve um entrelaçamento nas famílias pelo casamento. Como foi que isso ficou em poder da sua gente, de Mar?
Alistair de Mar mostrou-se misterioso.
— Um antepassado meu vivia na Franca, na ocasião. — Deixou a implicação flutuando no ar. — Era uma Lovat. Génio alegre e muito travêssa. Dizem que o Príncipe murchou quando ela se embeiçou por um jovem tratante chamado Pennyfeather, acreditem ou não. Temos um desenho dela, muito lindo, feito por Greuze. Bem — concluiu, levantando-se — vamos para a biblioteca?
Os outros também se levantaram e de Mar percorreu a mesa com o olhar.
— A propósito, quem tem o guinéu?
Fez-se silêncio. Todos fixaram a mesa e depois entreolharam-se.
— Provavelmente está debaixo de uma das chávenas — disse Powys, afastando a sua. — Deixem ver — observou o Coronel Wragg. — Eu entreguei-a a si, não foi Sutro?
— Sim, e eu larguei-a… ali, creio.
Pratos de sobremesa e talhares foram empurrados para o lado, e Wilson afastou a cadeira para olhar por baixo da mesa.
— Talvez tenha caído no chão — disse.
A busca continuou por algum tempo, mas sem sucesso. Finalmente ficaram a olhar uns para os outros, num silêncio constrangido. Isto é, cinco deles permaneceram de pé. Wilson continuava de gatas.
— A moeda tem de estar aqui — ouviram-no dizer.
— Por quê?
— Porque não se encontra em cima da mesa.
Mas acabou levantando-se também e limpar o pó dos joelhos.
Seguiu-se outro silêncio, mais constrangedor do que o primeiro.
— Eu acho — observou Finlay com autoridade — que devemos tanto nós como o nosso anfitrião… esvaziar os bolsos.
— Oh, não — começou a dizer de Mar.
Mas o Coronel pigarreou:
— Concordo plenamente com a ideia — disse.
E começou a largar o conteúdo dos bolsos em cima da mesa: cigarreira, carteira de notas. Abriu ambas, algum troco miúdo, um canivete e várias miudezas.
Todos ficaram a observá-lo, excepto Alistair de Mar que parecia profundamente embaraçado.
Os outros logo o imitaram — todos menos Wilson. Chegou a levar a mão ao bolso, e logo parou, com as faces muito vermelhas.
— E então? — Falou Finlay vivamente.
Wilson sacudiu a cabeça:
— Desculpe. Mais tarde poderei explicar, mas…
— Mas o quê, sir? — inquiriu o Coronel Wragg.
— Mas de momento não posso. Creio que se deve continuar a busca. É absurdo tomar uma atitude tão melodramática quando não se fez uma busca rigorosa.
— Não tem dúvida nenhuma!
— Para começar — continuou Wilson — um simples esvaziar de bolsos não implica numa busca completa.
— Ora, francamente, meus senhores — disse de Mar — A moeda acabará por aparecer. Mas não falava com grande convicção.
— Gostaria de saber — observou Powys — por que é que Mr. Wilson se recusa a esvaziar os bolsos e ao mesmo tempo insiste em que se reviste a sala. Confesso a minha inabilidade em adivinhar a razão desta última à luz da primeira. — Ergueu as sobrancelhas e pestanejou.
— Ele… — Wilson respirou fundo. — Não lhes posso explicar. Juro, apenas, que não fiquei com a moeda. E peço a todos que me ajudem a procurá-la. Como estaria pronto a aceitar a palavra de qualquer um dos presentes, suplico-lhes que acreditem na minha!
— E mais do que óbvio — disse Finlay — de que a moeda está com o senhor ou não está. Se não está, então é igualmente óbvio que não existe motivo para se furtar a um gesto praticado por todos. Exijo que faça como nós e esvazie os bolsos.
— Bem, é inconcebível para o senhor — retrucou Wilson olhando outra vez para de Mar. — Faço um novo apelo a todos para que me permitam revistar a sala.
— Dando-lhe assim a oportunidade de “encontrar"”a moeda que tem em seu poder? — disse o Coronel Wragg.
Wilson enrijeceu o corpo.
— Senhores, por favor! — exclamou de Mar.
— Um momento — disse Wilson de repente. — O senhor estava sentado ali, não é Sutro?
Todos o encararam e o escultor assentiu com um gesto de cabeça.
— Acabei de me lembrar que deixou a moeda de quina, — continuou. Wilson. — Assim, não é possível que tenha rolado? Quando de Mar se levantou da mesa nós todos desviámos o olhar do guinéu.
Ninguém lhe respondeu e Wilson apontou para uma fenda onde a jun-ção da mesa não se completara de todo.
Finlay franziu o cenho, não via a fenda.
Já revistamos o chão — disse ele. — Você mesmo procurou ali.
— Dê uma espreitadela debaixo da tábua — sugeriu Wilson.
Sutro ajoelhou-se e desapareceu de vista.
— Diabos me levem! — exclamou. — Está aqui? — Reapareceu triunfante com o guinéu na mão. — Com certeza caiu aí na brecha e ficou ali preso.
Colocou a moeda de ouro em cima da mesa e os outros reuniram-se em volta. Depois voltaram-se para Wilson. Em cada rosto via-se uma mistura de surpresa, perplexidade e até um certo acanhamento.
Meu caro senhor — falou afinal o Coronel Wragg. — Poderia dizer-nos por que motivo se recusou a…
— Mostrar o que trazia nos bolsos? — completou Wilson. — Fosse um pouco antes e não me teria recusado, mas não queria estragar a história de de Mar. Depois já era tarde demais.
Avançou e estendeu a mão fechada.
— É que, Tom Pennyfeather era meu antepassado e Henrietta Lova deu-lhe isto.
Abriu a mão. Na palma estava outro guinéu de ouro, perfeitamente idêntico ao primeiro.


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