EFEMÉRIDES – Dia 21 de Junho
Milward Rodon Kennedy Burge nasce em Inglaterra. Jornalista, crítico literário e autor policiário escreve 17 livros e algumas short stories sob o nome Milward Kennedy, e sob o pseudónimo Evelyn Elder publica 3 romances: Murder In Black And White (1931), Angel In The Case (1932) e Two's Company (1952). Milward Kennedy cria dois personagens: Sir George Bull and Inspector Cornford, que protagonizam os seus mistério de polícia. Faz parte de The Detection Club (1930) — um grupo de escritores policiários britânicos célebres, como Agatha Christie, Dorothy L. Sayers G.K. Chesterton, etc..— e é como co-autor que publica The Floating Admiral (1931). O livro, onde cada autor escreve um capítulo, é editado em Portugal pela Livros do Brasil, em Março de 1989, com o Nº500 da Colecção Vampiro e o título Quem Matou o Almirante?
Stuart Palmer (1905 – 1968)
Charles Stuart Palmer nasce em Baraboo, Wisconsin, EUA. Apaixonado desde a infância pelos livros de mistério e fã de Sherlock, torna-se argumentista e escritor policiário. Escreve o primeiro livro em 1931, Ace Of Jades, que é hoje uma raridade porque o autor o considerava muito mau, recusando a sua leitura, mesmo aos amigos. Stuart Palmer é conhecido por ter criado Hildegarde Withers, a versão americana da célebre Miss Marple. Hildegarde Withers aparece pela primeira vez em The Penguin Pool Murder (1931), o livro é um sucesso editorial. A série Hildegarde Withers tem 18 livros publicados, muitos deles adaptados ao cinema e televisão.
TEMA — QUANDO A JUSTIÇA ERRA — INOCÊNCIA INGRATA
Em todas as épocas, em todas as latitudes, os tribunais de justiça, por mais apetrechados, têm a sua quota-parte de erros. Erros que em alguns casos são irreparáveis. No caso de Tom Mooney, conhecido agitador operário de são Francisco, Califórnia, é sintomático e de triste memória, por mais de um motivo
No dia 22 de Julho de 1916, decorria uma manifestação a favor dos USA na guerra que perturbava a economia mundial. A grande massa de aderentes marchava lentamente sob a vista atenta das forças policiais, porquanto sabia-se que sindicalistas se arrogavam representantes de dezenas de milhares de operários estavam preparados para interferir com os manifestantes. Estes confiadamente haviam chegado ao cruzamento da Stewart Street com a Market Street, quando uma bomba de dinamite foi arremessada sobre ela, resultando dez mortos e dúzias de feridos atingidos pelos estilhaços. A polícia agiu de imediato e prendeu todos os suspeitos. Todos menos Moonet; tinha álibi, isto é a declaração de que presenciara os acontecimentos de uma janela de Stewart Street, de onde não poderia atirar a bomba. Isso não foi tido em conta pelo tribunal que soube enterrar o réu em provas circunstanciais, condenando-o a prisão perpétua. Na penitenciária de San Quentin. Angustiado pela injusta sentença — realmente estava inocente do crime que lhe imputavam — o condenado pensara não mais ter liberdade, estava enterrado em vida. A esposa e companheira dedicada, não se entregou ao desespero, trabalhou arduamente vários anos para se sustentar, auxiliar financeiramente o marido na prisão, esforçando-se em buscas para encontrar uma brecha para tirar Tom do cárcere, falando com juízes e advogados. Finalmente vinte e dois anos depois, encontrou uma fotografia num jornal onde reconheceu o marido na janela onde ele sempre indicara estar no dia da manifestação. Procurou o tribunal e expôs o assunto. A fotografia foi ampliada e novas testemunhas foram ouvidas e conferidas as datas e as horas, medidas as distâncias. O tribunal acabou por declarar inocente Tom Mooney, ordenando a sua libertação.
Reabilitado e feliz, embora envelhecido saiu pelo braço da mulher. À porta da penitenciária esperava-o uma multidão que rompeu em aplausos. O seu nome — o mártir da justiça — era pronunciado com respeito, as dádivas valiosas surgiram de todas as partes, dinheiro, presentes, o cinema e a rádio pagaram generosamente as suas memórias. De um momento para o outro viu-se elevado aos pícaros da fama e rico.
O inacreditável surgiu então, estarrecendo de espanto o mundo inteiro, logo que a imprensa e a rádio deu a notícia: Tom Mooney pediu o divórcio! Por incompatibilidade de génios, de feitios opostos, antagónicos — afirmou. A Senhora Mooney, com simplicidade e sinceridade que sempre lhe reconheceram, disse aos jornalistas: — Tom já não é o homem que conheci e assisti, quando estava preso; era um homem simples atormentado pela injustiça. Com a reparação do erro e fortuna que ela lhe trouxe, deixou-se embriagar pela notoriedade e luxo… o que me revolta é a ingratidão.
O divórcio foi decretado, Mooney é obrigado a conceder à mulher uma pensão razoável, mas espera outras, certamente.
Comentário:
No princípio, o que a qualquer pessoa pode acontecer; no fim, o que qualquer pessoa deve evitar acontecer!
M. Constantino
TEMA — CRÓNICA REPÓRTER X — A MÚMIA VIVA
Bem sei que uma múmia é o temo médio entre o cadáver, (que foi vitrine de um ávida e que se decompõe pela mesma fatalidade química que gera os corpos) e a estátua parida pelo bloco de mármore de que o escultor foi o parteiro. Materialistas e espiritualistas — acordam todos que uma múmia é uma múmia, matéria talvez respeitável mas vazia do dínamo supremo a que se chama alma.
Contudo, tão sobrecarregadas de lendas estão as múmias, com a sua corte de feitiçarias, eternidades, presságios, agouros, ligações directas com a vida — que uma múmia irradia sempre angústias e nervosismos.
Em Portugal, já o disse, existe um stock razoável de múmias. Quem as trouxe? Ignoro. Mas creio que a múmia teve, entre nós, a sua época: foi moda. A primeira que contemplei foi em casa e Adriano Gomes. Era eu então menino de colarinhos á mamã e acompanhava a família numa visita solene de domingo. A múmia que ele herdara não sei de que avó, foi exibida às visitas, que logo se retiraram para o salão, esquecendo-se de mim, que esquecido quisera ficar, atraído pelo mistério daquele artigo de bric-à-brac. Rondei a vista. Ninguém. E pus-me a sondá-la, rindo-me do dono da casa que nos quisera convencer que nas entranhas daquela boneca de cartão colorido, igual em fabrico embora maior em tamanho, ao cavalo de pasta em que eu galopava, parado, na varanda de minha casa — existia um defunto. E por muito evidente que fosse para mim esse disparate — as afirmações de Adriano Gomes tinham-me mercuriado a imaginação. Ali dentro havia um corpo humano, um cadáver dalgumas dezenas de séculos. Sim? Não? Tamborilei com os dedos no invólucro… Nada! Olhei em redor. Vi uma almofada, S. Sebastião de seda onde as donas da casa desflexavam os pregos do chapéu (naquele tempo as senhoras ainda necessitavam aparafusar os chapéus à cabeça). Retirei um dos pregos e com cautelas de ladrão nocturno trespassei a múmia.
Seria a imaginação a mise-en-scenar tragédias dentro de mim? Sei lá… Mas Jack., o Estripador, não se convulsionaria em maiores emoções desventrar uma vitima, do que eu ao perfurar a, múmia com o corpo esguio e magro do alfinete. Os dedos premidos na cabeça eram antenas receptadoras do que a extremidade sentia ao dilacerar a matéria empastada. Dir-se-ia que os meus dedos seguiam a caminhada do alfinete através da carne; dir-se-ia da que essa carne vivia, sofrendo a perfuração que eu provocava. Quisera eu parar, retirar o alfinete — mas já não podia. Tinha de alfinetar a múmia até que os dedos tocassem na capa rija que a revestia. E mal eles a alcançaram, uma sacudidela nervosa me obrigou a encolher o braço e a retirar o alfinete.
A testa tornara-se em fonte. O alfinete vinha vermelho — um vermelho rubro, um vermelho cor de sangue.
Durante muito tempo este episódio ficou escondido, como uma prova de crime, no saguão da minha consciência. Anos depois descobri-o, quase a medo, a um amigo especialista que se riu dos meus temores. Atribuía ele a não sei que resultante da embalsamação a tintagem do alfinete… Seria verdade?
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