EFEMÉRIDES – Dia 5 de Junho
Craig Rice (1908 - 1957)
Georgiana Ann Randolph Walker Craig nasce em Chicago EUA. Produtora e escritora para rádio, depois de várias tentativas, começa uma carreira literária de sucesso com a primeira história de John J. Malone, que publica sob o nome Craig Rice. Cria também a dupla Bingo Riggs & Handsome Kusak e ainda Melville Fairr que protagoniza 3 romances que a autora escreve sob o pseudónimo Michael Venning. A escritora, que usa também os pseudónimos Daphne Sanders, George Sanders e Ruth Malone, é autora de vários romances, peças de teatro, textos de crime real e um sem número de contos. À época rivaliza em vendas com Agatha Christie e é a primeira escritora de policiário na capa da Time Magazine em 1946. Em Portugal estão editados:
1 – Testemunha Inocente (1953), Nº25 Colecção Escaravelho de Ouro, Editoral Édipo. Título Original: Innocent Bystander (1949)
2 – Cilada Triangular (1954), Nº34 Colecção Escaravelho de Ouro, Editoral Édipo. Título Original: Home Sweet Homicide (1944). Reeditado em 2005 pelo Público, na Colecção 9mm - Nº12
3 – Crime No Tribunal (1955), Nº48 Colecção Xis, Editoral Minerva. Título Original: Trial By Fury (1941). 5º Livro da série John J. Malone
4 – O Meu Reino Por Um Túmulo (1960), Nº26 Colecção Enigma, Editora Ática (Lisboa). Título Original: My Kingdom For A Hearse (1957). 11º Livro da série John J. Malone
5 – Condenado À Morte (1961), Nº31 Colecção Enigma, Editora Ática (Lisboa). Título Original: Knocked For A Loop (1957). 10º Livro da série John J. Malone
6 – O Crime Também Diverte (1962), Nº14 Colecção 3 C, Editora Ulisseia Título Original: Having Wonderfull Crime (1943). 7º Livro da série John J. Malone
TEMA — SHORT STORY — A PROVA
De Orlando Guerra
O estampido encheu a casa toda.
Viu abater-se. Lentamente, sobre a alcatifa, uma expressão de surpresa desaparecendo-lhe no rosto, a mancha vermelha alastrando-lhe do roupão entreaberto.
Há muito suspeita de que ela o traía e a prova ali estava agora, cintilando no tampo de vidro da mesa — aquele isqueiro Dupont lacado. As saídas sempre inexplicadas coroavam num encontro em sua própria casa.
A prova acusadora não mentia: dissera não ter tido qualquer visita.
Os olhos cerrados, parecia adormecida. Era bela, tremendamente bela, mesmo na morte… E a mancha vermelha engrossava ainda, quase a atingir a alcatifa.
— Triim!
— O telefone!
— Manuela! Sou eu, o João…
O irmão dela, seu cunhado. Há quanto tempo não dava sinal de vida
— … procurei o Francisco, mas não estava. Deixei recado. Não te preocupes que ele vai entender as visitas que me fazias enquanto estive preso, e tudo vai acabar bem… sempre sou o teu único irmão… Ah, é verdade, vê se quando há pouco estive contigo, deixei aí o meu isqueiro… É de estimação… um Dupont lacado… Manuela! Manuela!
O braço caiu-lhe, o telefone pendurado…
Apercebeu-se, vagamente, da voz do cunhado, do outro lado do fio.
— Manuela! Está a ouvir-me? Sobre o tampo da mesa o isqueiro cintilava.
Alcançando já a alcatifa, a mancha vermelha alastrava ainda…
TEMA — BREVE HISTÓRIA DA NARRATIVA POLICIÁRIA — 15
(continuação de CALEIDOSCÓPIO 149)
Em 1764 Horace Walpole (1717-1797) com The Castle of Otranto, inicia uma nova escalada com o género classificado posteriormente de gótico, caracterizado por cenários medievais com castelos, criptas, galerias assombradas, claustros em ruínas, ambientes de mistério, de terror, de suspense, como também de policiário, já que, as posições, questões ou interrogações dos textos, requerem investigação e resposta… uma explicação por vezes simples e lógica, elementos estes concernentes ao esqueleto narrativo daquele último género — o policiário.
Em The Castle of Otranto, cenário das festas de aniversário coincidentes com os esponsais do jovem príncipe Conrado, enquanto toda a gente reunida na capela aguarda a sua chegada, um criado descobre-o
… esmagado, ainda semi-enterrado por debaixo de um elmo gigantesco, porventura cem vezes maior que o elmo de um homem normal, encimado por proporcional quantidade de plumas negras.
Sem ser um escritor policial, Walpole inspira para o tema autores como Clara Reeve, Beckford e Schiller. Este, em 1789, escreve uma novela do género, Der Geistersecher, que também narra um mistério sobrenatural, explicado pela lógica natural.
Anna Radcliff (1764-1823), com The Mysteries of Uldolpho (1794), obra desenvolvida no castelo de Uldolpho, cujo interesse para a narrativa policiária reside na particularidade de, em clima sinistro, manifestamente sobrenatural, se verificar
… a desaparição de um criado de um quarto completamente fechado.
A contribuição maior para o tema, provém de William Godwin (1756- 1836) com The Adventures Of Caleb William Or Things As They Are (1794) narrativa algo volumosa, mas um verdadeiro trabalho detectivesco de Caleb sobre o assassinato de Barnabas Tyrrell. Apesar das pistas falsas deixadas pelo assassino para encobrir a sua identidade, Caleb, de investigação em investigação descobre o assassino, mas vê-se obrigado a fugir à sua perseguição, disfarçando-se frequentemente, até que consegue que aquele confesse a sua culpabilidade.
Tem de tudo um pouco esta extensa narrativa: detectivismo, psicologia, aventura e política… é uma obra de meditação: a moderna corrente de denúncia da corrupção dos poderes públicos, aliança policial com o grande capital, que teve em Dashiell Hammett e Chandler representantes destacados, colhe em Godwin um precursor.
Esta obra de Godwin tem sido classificada sobre diversas etiquetas, romance, psicológico, de detective, de aventuras, de perseguição ou romance político, continuando aparentemente com dificuldades de encaixe.
Supomos porém, depois de um conhecimento sobre a vida do autor, ser lícito optar — sem desprezo pelas outras vertentes extraídas do extenso texto — pela que o autor quis. Isto é, expor as suas ideias anarquistas, logo políticas.
Em 1793 havia escrito Enquiry Concerning Political Justice, esboço do seu ideal anarquista. Godwin atacava praticamente todas as instituições do Estado e o próprio sistema legal, opondo-lhe um mundo sem guerras, sem crimes sem administração da justiça, nem governo. A Revolução Francesa foi tema para conseguir muitos simpatizantes, convertendo-se mesmo em líder intelectual do movimento radical inglês.
O título original de Caleb Williams foi Things As They Are e pretendia denunciar a corrupção inerente a todo o sistema legal vigente, situação que se revela, subtilmente, no romance. Godwin aposta na força extraordinária do reconhecimento da natureza humana de quem viola a Lei. Pela sua pena vemos o cabecilha de um gang de ladrões unir-se a Caleb enquanto este expõe a sua doutrina:
Nós, ladrões sem licença, vamos declarar guerra a homens de outra índole, os ladrões legalizados.
Apercebemo-nos, por outro lado, na leitura do enredo, que há parágrafos de amargo sarcasmo com respeito ao código de honra dos governantes.
Está pois à vista a intenção do autor, sem deixar de ser uma obra, que do ponto de vista puramente criminal, não deixa de ser aceitável.
William Godwin |
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