Efemérides 28 de Julho
Kenneth Fearing (1929 - 1961)
Kenneth Flexner Fearing nasce em Oak Park, Illinois, EUA. Jornalista, editor, poeta, romancista e autor de romances policiários: The Hospital (1939), Dagger Of The Mind (1941), Clark Gifford’s Body (1942), The Big Clock (1946), Loneliest Girl In The World (1951),The Generous Heart (1954), e The Crozart Story (1960). O livro mais conhecido do escritor é The Big Clock que foi adaptado por duas vezes ao cinema, em 1948 e em 1987, esta última versão com o título No Way Out com Kevin Costner, Gene Hackman e Sean Young.
TEMA — ALGO DE SOBRENATURAL — A FIGURA DO DIABO (PARTE 3)
Figura responsável por calamidades, sofrimentos, infelicidades ou má sorte, tão actuante o diabolicamente obscuro, bem merece a lapidar frase de Baudelaire:
A mais bela astúcia do diabo é persuadir-nos de que não existe ".
Mas, quem é este personagem assim prendado? Quem o viu? Existe realmente essa satânica criatura?
Raoul Glaber, um monge do mosteiro do Saint-Léger (cerca do Ano 1000) afirmava que o viu na forma de um pequeno monstro de forma humana.
Sonho? Alucinação? Realidade?
Do mundo da Arte são incontáveis as figurações: os textos literários, esculturas e pinturas representam-no, geralmente com chifres, barba em ponta, pés de cabra, asas de morcego.
O inquiridor Pierre de Lancre é categórico:
“ a face do diabo era geralmente triste e enrugada, tinha a testa ornada do pequenos cornos ,com três outros muito grandes semelhantes a cornos de bode, um sobre a frente da cabeça e os outros da parte de trás, olhos redondos, grandes, abertos, inflamados e ameaçadores, uma barba do chibo, o rosto negro, corpo de bode e homem ao mesmo tempo, pés e mãos iguais de dedos afilados e enganchados como garras…”
Dante em a “Divina Comédia”:
“ esse imperador do doloroso reino/tinha quase meio corpo saído do gelo/gigante/ feio/três faces/duas asas enormes como velas do barco, não cobertas de penas mas como os morcegos, seis olhos/face negra/”
Com que base o retrato? Perguntamos novamente:
Sonho? Alucinação? Realidade?
Faz, em regra, parte constante do nosso dia a dia, na linguagem, no pensamento, nas acções. Existem pensamentos e fazem-se coisas do diabo, têm--se relações e proclamam-se conluios com o diabo, pinta-se o diabo, actua-se por artes o tentações do diabo… o diabo a quatro!
O povo, melhor juiz, sentencia através dos populares provérbios:
De pai santo, filho diabo.
Ira de irmãos, ira de diabos.
Pai não tiveste, mãe não temeste, diabo te fizeste.
Ri-se o diabo quando o faminto dá ao farto.
A cruz nos peitos e o diabo nos feitos.
Na arca do avarento o diabo faz dentro.
O homem é fogo, e mulher é estopa, vem o diabo e assopra.
É motivo de pensamentos eruditos:
Como deve ser tolo o que faz de graça a tarefa do diabo (Heary Fielding)
Mais vale evitar que o diabo entre do que expulsá-lo de dentro da casa: (Thomas Fuller).
O diabo é mais demoníaco quanto mais respeitável (Elizabeth Browning)
Quando o diabo está satisfeito e boa pessoa (Jonathan Swift)
O diabo tem cuidado com os seus seguidores (Thomas Meddleton).
Terríveis são os ardis e as malhas do diabo para que as almas não se conheçam nem compreendam qual o seu caminho" (Santa Tereza).
É cantado:
‘stou farto de romper solas,
Quem não anda não aprende,
Cartas, mulheres e bolas,
Só o diabo as entende.
O diabo leve as mulheres,
Sem ‘ma única excepção,
A primeira seja a minha,
Segunda a do meu patrão.
Os homens são como os lobos,
Só lhes falta ter rabo,
Aparecem às donzelas,
Em figura de diabo.
Motiva orações:
“Glória a ti e louvor, satã, nas alturas do céu em que reinaste, e glória nas negruras do inferno em que sonhas, silencioso, vencido! Faz que um dia o meu espírito repouse satisfeito contigo, sob a árvore da ciência, oh satã! Quando, moderno templo os seus ramos se abrirem”. (Charles Baudelaire)
Sonho? Alucinação ? Realidade ?
(continua)
TEMA — CONTO — O ESTRIPADOR
De Natércia Leite
A atravessar o jardim segue a jovem mulher.
O dia correu bem; leva dinheiro.
A madrugada alta, em lua pardacenta ,parece deslizar no céu.
Há um vulto que sai dos arbustos, um homem, e que se aproxima.
Trocam em voz baixa algumas palavras. Os corpos tocam-se…
O homem encosta-se ao corpo da mulher, e ela sente que algo fino lhe rasga o ventre, de baixo para cima, a estraçalha, e que o sangue corre em borbotões, quente… quente, junto com as vísceras. E tudo muito rápido e a noite escura engole a cena.
No quarto muito pobre a rapariga tirita de frio. Tem fome.
Nem um só cliente ainda, naquele dia.
A tarde morreu há pouco. Está escuro.
Batem de manso à porta.
Ela abre-a, esperançada.
Envolto num sobretudo o homem entra. Mala na mão. Parece um médico.
Falam. Combinam preços…
Ela está repousada, satisfeita agora. Obedece às ordens dele. Deita-se de costas. Desnuda-se…
E na ténue luz do quarto a lâmina rasga o ventre com um golpe certeiro, de baixo para cima. A dor é funda, enorme. O quarto dança. O esquecimento devora-a
Por um copo vende-se. Anda pelo mercado, conhece toda a gente. E já entrada nos anos e está estragada e gasta.
Por um copo, por pouca coisa, vende-se.
E há quem a disfrute, se aproveite dos restos do seu viço.
Anoiteceu há pouco. Encostada à parede da viela escura espera, nem sabe bem o quê.
O homem vem e com arte e rapidez estripa-lhe o ventre e acaba com aquele comércio em decadência.
Desaparece depois, ligeiro, feito sombra, confundido com as sombras da noite.
O corpo escorrega pela parede, ajeita-se no chão, qual monte de roupa velha…
O sangue empapa tudo. As tripas saiem do corte brutal…
E bela, fina, aristocrática. Atende só pelo telefone, com marcações.
A discrição é tudo!
O cavalheiro chegou. Traz champanhe e bombons.
Conversam. No sofá trocam-se, baixo, como que confidências.
Há um silêncio enorme que os envolve.
A discrição continua a ser tudo!
E a lâmina rasga as carnes róseas da prostituta fina, esventrando-a em silêncio.
Os olhos abertos, claros, espantados…
O sangue que escorre do sofá para a alcatifa…
Vários casos. Vários ventres esfaqueados.
As mulheres têm medo de sair no escuro. Principalmente as prostitutas.
Estranho assassino que sabe manejar com perícia o bisturi.
Depois a onda passa. Os crimes param…
Perde-se no tempo a marca do Estripador!
Até quando?
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