24 de julho de 2012

CALEIDOSCÓPIO 206

Efemérides 24 de Julho
Mildred Gordon (1905 – 1979)
Mildred Nixon Gordon nasce no Kansas, EUA. Professora e editora forma uma dupla com o marido na escrita de policiários: The Gordons já referidos no CALEIDOSCÓPIO 72 (clicar)

John D. MacDonald (1916 – 1986)
John Dann MacDonald nasce em Sharon, Pensilvânia, EUA. Autor de perto de 500 contos (western, ficção científica e policiais) e mais de 70 romances policiários é conhecido principalmente pela série Travis McGee, iniciada com The Deep Blue Good-by em 1964 e terminada em 1984, 21 títulos depois quase todos passados na Florida. John D. MacDonald é um escritor conceituado, com mais de 75 milhões de cópias dos seus livros vendidas em todo o mundo tem um vasto leque de distinções e prémios com destaque para Benjamin Franklin Award (Best Short Story) em 1955; Grand Prix de Littérature Policière em1964 com A Key To The Suite, (1963); American Book Award (National Book Award) em 1980 com The Green Ripper, un dos últimos livros da série Travis McGee; Presidente da Mystery Writers of America em 1962 e detentor do título de Grand Master de 1972 desta organização. Os admiradores de John D. MacDonald consideram que a maior prova do valor da escrita do autor é comprovado agora, mais de 25 depois da sua morte, pela publicação dos seus livros, a adaptação a filme das suas obras e a discussão na Internet do seu trabalho literário e outras questões relacionadas com o escritor. Em Portugal estão editados os seguintes policiários do autor:
1 – Onde Está Janice? (1962), Nº3 Colecção Ângulo Negro, Editorial Íbis. Título Original: Where Is Janice Gantry? (1961).
2 – Só Se Vive Uma Vez (1963), Nº5 Colecção Ângulo Negro, Editorial Íbis. Título Original: You Live Once (1956).
3 – Não Me Condenem (1964), Nº6 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Judge Me Not (1951).
4 – Doce Carícia (1965), Nº18 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Soft Touch (1953).
5 – O Adeus Profundo E Azul (1965), Nº31 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: The Deep Blue Good-By (1964). É o 1º livro da série Travis McGee.
6 – Pesadelo Cor De Rosa (1966), Nº36 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Nigthmare In Pink (1964). Reeditado em 1988 pela Livros do Brasil com o Nº491 da Colecção Vampiro. É o 2º livro da série Travis McGee.
7 – A Raposa Vermelha (1966), Nº43 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: The Quick Red Fox (1963). É o 4º livro da série Travis McGee.
8 – Morte Em Cenário Púrpura (1966), Nº47 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: A Purple Place For Dying (1963). É o 3º livro da série Travis McGee.
9 – A Mortal Do Sombra Do Ouro (1966), Nº50 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: A Deadly Shade Of Gold (1965). É o 5º livro da série Travis McGee.
10 – O Sudário Cor De Laranja (1967), Nº58 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Bright Orange For The Shroud (1965). É o 6º livro da série Travis McGee.
11 – Mais Escuro Do Que O Âmbar (1967), Nº64 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Darker Than Amber (1966). É o 7º livro da série Travis McGee.
12 – O Olho Amarelo (1967), Nº69 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: One Fearful Yellow Eye (1966). É o 8º livro da série Travis McGee.
13 – Cinzento Pálido Por Nossa Culpa (1968), Nº82 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: Pale Gray For Our Guilt (1968). É o 9º livro da série Travis McGee.
14 – O Último Fica Vivo (1968), Nº100 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: (?)
15 – A Encruzilhada (1969), Nº116 Colecção Rififi, Editorial Íbis. Título Original: The CrossRoads (1959).
16 – O Mistério Do Iate Desaparecido (1990), Nº520 Colecção Vampiro, Livros do Brasil. Título Original: The Lonely Silver Rain (1985). Também editado em 1991 pelo
Círculo de Leitores com o título Chuva De Prata. É o 21º livro da série Travis McGee.
17 – Uma Bala Para Cinderela (1999), Círculo de Leitores. Título Original: A Bullet For Cinderella (1955) também editado com o título On The Make.


TEMA — ESTUDOS DE PSICOLOGIA CRIMINAL — DESPOTISMO
A ninguém é lícito fazer justiça pelas próprias mãos. Tempo houve em que a justiça privada teve o seu fastígio. Mas o espírito da civilização repele o direito de punir pelo indivíduo à revelia das leis. E o que, a despeito dessa proibição, se erige em juiz e em executor das suas próprias sentenças contra alguém, ainda que seja a esposa ou o filho, tem de enfrentar a outra e autorizada justiça.
Nas regiões longínquas, porém, onde não chega a autoridade judiciária, e nem mesmo a policial, o homem costuma fazer justiça pelas próprias mãos. Daí os excessos praticados. Daí a sequência de delitos. Ainda hoje há lugares onde os senhores latifundiários reivindicam o direito de castigar pelo chicote, pelo tronco, pela tomada violenta das plantações, benfeitorias, ou pela expulsão das suas terras, aqueles que incidem nos seus códigos penais. Isto quando o código não é o da honra, à moda dos sertões…
A literatura regionalista está cheia de episódios desse género. Assim, em Inocência do Visconde de Taunay. Assim, em A Selva o romance amazonense do escritor português Ferreira de Castro. O autor pinta a justiça dos seringueiros, brutal, despótica, sem piedade. Porque uns trabalhadores fugiram, o proprietário, que os recebe de outro, de vez que aí os latifundiários se ajudam reciprocamente, manda prendê-los num porão, de pulsos amarrados nas costas, ainda assim seguros à parede, e durante a noite, na escuridão, além da fome a que os obrigam, o feitor desalmado entra no catre e chicoteia-os com um látego de peixe-boi, até que sangrem. Então o negro Thiago revoltado pega fogo ao barracão, onde morre o senhor queimado. Entrega-se, dizendo:
Branco, me mande para a cadeia de Humaitá. Fui eu que deitei fogo ao barracão e fechei as portas para seu Juca não sair. Eu também, gostava muito do patrão. Ele me podia até matar que eu não fugia. Era mesmo amigo dele. Mas seu Juca se desviou. Estava a escravizar os seringueiros. Tronco e peixe-boi no lombo só nas senzalas. E já não há escravatura…
Capa de Jorge Barradas


TEMA — TRAVIS McGEE; UM PERSONAGEM DE MacDONALD
Por M. Constantino
O personagem de John Dann MacDonald tem uma estranha profissão: dedica-se a recuperar coisas valiosas, geralmente roubadas, cobrando como honorários 50% do seu valor. A profissão não será muito legal, todavia Travis tem a seu favor o facto de as vítimas — pois realmente em vítimas se convertem ao caírem nas suas mãos — serem criminosos, e deste modo ressalva moralmente o seu comportamento. Trevis rege-se por uma ética aceitável no que respeita à lei e aos seus clientes, estes preferem, naturalmente, recuperar metade do perdido a ficarem sem nada.
Vive numa casa flutuante, tipo barcaça, ancorada quase sempre no porto de Fort Lauredale, mas sempre pronto a deslocar-se às praias da Florida, incluindo as Bahamas.
É um aventureiro que está para além de detective. Não se importa de realizar os seus negócios fora de lei ainda que procure que os seus interesses com ela coincidem. É de certo modo um justiceiro — os maus são seus inimigos e também inimigos da lei, logo o seu êxito pessoal é também um serviço prestado à sociedade.
Enganosa e perigosa profissão, que não deixa de ser interessante e notável. Não é verdade que ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão?
É o fundamento filosófico, básico de Trevis MacGee, desde a sua criação em 1964.



TEMA — CONTO POLICIÁRIO — O CASO DA JANELA ESTREITA
De Fernando Saldanha
Velha, muito velha, talvez perto dos noventa anos, o entretenimento favorito dela era passar o tempo a espreitar pela janela das insalubres águas-furtadas em que vivia quase desde que nascera.
Viúva há quarenta anos, vivia duma magra pensão e dedicava-se a mironar o movimento da rua, espiando o trânsito, transeuntes e vizinhos. Praticamente só saia da janela para fazer compras, alimentar-se e dormir.
O vaivém dos vizinhos merecia-lhe particular atenção, principalmente de Policarpo Anjos, o velho agiota que morava no prédio fronteiro, ao nível do seu piso. Conseguira descobrir o esconderijo onde ele guardava zelosamente o dinheiro que avaramente emprestava a juros e deliciava-se a vê-lo conferir cobres e notas, todas as noites antes de se deitar, como se cumprisse um ritual muito delicado e prazenteiro.
Foi assim que a velha viu o crime.
Uma noite, quase à hora de se meter na cama, a velha observou que entrava um cliente na casa de Policarpo Anjos e assistiu à transacção habitual, com o agiota a passar para a mão do cliente um grosso maço de notas, que ela presumia dentro em pouco ir render o dobro.
Estaria tudo em ordem se não fora a cena violenta que se desenrolou em seguida. Transida de susto, viu o cliente levar as mãos ao pescoço do agiota e apertar com força até este tombar sem vida. Depois, o criminoso cujas feições ela viu bem, dado que as luzes estavam acesas, vasculhou a casa de Policarpo, descobriu o local onde o cofre dele se encontrava, pegou num maço de notas, fez um embrulho com ele, e saiu, deixando tudo às escuras.
O crime estava consumado. O que o assassino não sabia, era que o seu acto tivera uma testemunha.

Na manhã seguinte, a mulher que trabalhava a dias na casa de Policarpo deu com o cadáver e chamou a Polícia.
A Brigada de Homicídios, composta por um inspector e dois agentes veio pouco depois e pôs-se a trabalhar no caso, cumprindo as formalidades usuais, tirando fotografias, impressões digitais e investigando a identidade da vítima e o seu modo de ocupação.
De posse das informações prestadas pele empregada de Policarpo, os agentes chegaram facilmente à conclusão de que o móbil do crime fora o roubo, dado que o agiota possuía sempre consigo avultadas quantias para a realização dos seus negócios.
— Vamos ter de fazer uma operação de limpeza nos marginais habituais desta zona. — admitiu o inspector — Em todo o caso, — ordenou — dêem uma volta peia vizinhança a ver se alguém detectou as visitas à vítima. Somente por rotina, pois não acredito que o criminoso não tomasse precauções para não ser visto.
Os subordinados obedeceram e voltaram, pouco depois, com novidades.
— Encontrei uma velha a afirmar que assistiu ao crime. — anunciou um deles — Diz que mora aqui defronte, estava à janela, e viu tudo.
— O quê? Uma testemunha? — opinou o inspector em tom incrédulo — Uma velha? Aí temos as costumadas complicações. Certamente que se trata de uma paranóica. Temos experiência bastante para saber que quando se dá um caso destes aparecem logo um ou dois tresloucados a dizer que viram tudo e afinal não passa de imaginação doentia, só servindo para dar trabalho. Manda-a embora. Nem merece a pena ouvi-la.
O agente ia obedecer ao superior, quando pela porta, deixada aberta, surgiu a cabeça da velha, muito velha, que espreitava pela janela estreita das águas-furtadas.
— Os senhores são da Polícia? — perguntou ela timidamente — Venho para prestar declarações sobre o assassínio do agiota.
Depois, ante a surpresa geral, ficou estarrecida ao deparar com inspector. Fez o sinal da cruz e ia a esgueirar-se pela porta fora qu ando o agente que estava mais perto a deteve, segurando-a firmemente.
— Que temos, boa velhinha? Preste ao senhor inspector as suas informações. — convidou ele, colocando-a defronte do superior.
— Inspector? Inspector? — gaguejou a velha — O criminoso é que é. Vi-lhe bem a cara.

 Aguarela de Vincent van Gogh

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