Efemérides 11 de Dezembro
Kenneth Royce (1920 – 1997)
Kenneth Royce Gandley nasce em Croydon, South London, Inglaterra. Autor de policiários, em especial trillers, escreve quase 4 dezenas de romances. Publica o primeiro livro, My Turn To Die , em 1958; é o criador de Spider Scott, o XYY Man, um ex-ladrão de carros que protagoniza 8 livros e cujas aventuras estão adaptadas ao cinema. Kenneth Royce usa também o pseudónimo Oliver Jacks. Em Portugal está editado:
1 – A Ilha Em Fúria (1964), Colecção Biblioteca para Todos, Editorial Minerva. Título Original: The Angry Island (1963)
2 – Paira A Morte Na Selva (1965), Nº148 Colecção Xis, Editorial Minerva. Título Original: The Day The Wind Dropped (1964).
3 – Ossos Na Areia (1968), nº181 Colecção Xis, Editorial Minerva. Título Original: Bones In The Sand (1967).
4 – O Homem XYY (1974), Nº23 Colecção Círculo Negro, Bertrand Editores. Título Original: The XYY Man (1970). É o 1º livro da série Spider Scott.
TEMA — CASOS E ACASOS DO CRIME — MORTE À DISTÂNCIA
Qualquer polícia atestará, sem vacilar, que o trabalho em conjunto é a chave do sucesso em todas as investigações criminais.
Foi uma equipa famosa a que se empenhou na caçada a um dos mais cruéis assassinos da América do Norte, em Setembro de 1949, na cidade de Québec, no Canadá.
O problema com que se defrontou o Capitão Alphonse Matte — da “Quebec Provincial Police” um dos mais argutos polícias do Canadá, não se cingia simplesmente a agarrar um delinquente; era bem mais complexo.
Antes de mais nada, tinha que descobrir quem o criminoso pretendera matar, visto que para se desembaraçar de uma única pessoa, destruíra vinte e duas vidas.
A história começou na manhã de 9 de Setembro de 1949 com o voo 108 da “Quebec Airways”, cujo avião estava de partida do aeroporto de Ancienne-Lorette para Sept-Isles, no Golfo de St. Lawrence, com escala na cidade de Baie-Comeau. Esse voo iniciara-se em Montreal, devendo o aparelho receber passageiros e carga em Quebec.
Pilotava a aeronave um antigo capitão da R.A.F., Pierre Laurin, viajando na mesma dezoito passageiros e quatro tripulantes.
Aos nove minutos de voo, o Comandante Laurin corrigiu a rota, rumando em direção à margem norte do St. Lawrence, de onde seguiria o curso do rio, cada vez mais largo e caudaloso.
Mais alguns minutos e a viagem terminaria numa pavorosa tragédia.
Várias pessoas a testemunharam: o terceiro piloto de um navio fluvial e alguns trabalhadores da ferrovia; além de pescadores e lenhadores.
Os seus depoimentos foram concordantes. O aparelho voava serenamente quando, de súbito, pareceu explodir.
Os destroços espalharam-se no terreno adjacente a um despenhadeiro rochoso, pouco distante do rio, perto da aldeia de "Sault-au-Cochon", a sessenta e cinco quilómetros de Québec, acessível somente por via férrea.
À noitinha, a “Quebec Provincial Police” e a “Royal Canadian Mounted Police” empregaram-se na melancólica tarefa de transportar os corpos mutilados no desastre, classificando-o como o terceiro dentre os piores ocorridos no Canadá.
Várias partes do avião foram removidas com o máximo cuidado para Québec, e submetidas a meticuloso exame.
Ainda que horrorizados, todos tiveram de render-se à evidência desconcertante, perfeitamente demonstrada pelo Professor Lucien Grave, catedrático da Universidade de Laval, apoiado por outros cientistas, de que o desastre fora provocado criminosamente.
Na fuselagem, certas perfurações esquisitas foram causadas pelas engrenagens de um despertador; manchas pretas no compartimento de cargas provinham, certamente, de pilhas secas e em diversos fragmentos do avião existiam vestígios químicos do trinitrotolueno, componente da dinamite.
Alguém causara aquela explosão, onde perderam a vida, numa verdadeira chacina, vinte e três cidadãos.
O Capitão Matte recebeu ordem através do rádio do seu carro para cancelar: qualquer compromisso e desvendar o crime.
Depois de examinar pessoalmente o local, onde jaziam os restos do avião, a primeira providência de Matte foi estudar a lista de passageiros, coligindo outras informações, inclusive consultando o mapa com a rota do aparelho, fornecido pelos detectives da companhia.
Um facto significativo destacou-se. Se o avião tivesse decolado rigorosamente dentro do horário, seus destroços teriam caído ao rio, tornando quase, impossível a identificação do crime.
Obviamente, a explosão visava a matar um dos passageiros. Mas qual deles?
De acordo com os relatórios técnicos, a explosão verificara-se no compartimento de bagagem da proa, o que limitava vantajosamente o campo das investigações. Para facilitar o serviço de carga e descarga, esse compartimento estava reservado às bagagens embarcadas e desembarcadas no Québec.
Vários polícias levantavam a vida pregressa dos passageiros desta última cidade, tomavam apontamentos sobre suas malas e embrulhos e, principalmente, estavam interessados em descobrir se alguém remetera algum volume, despachado em nome de outra pessoa.
Os primeiros resultados foram negativos.
Mais tarde, um dos auxiliares do Capitão Matte telefonou, comunicando que um indivíduo chamado Delphis Bouchara expedira uma encomenda pelo avião com destino a Baie-Comeau.
— Entretanto — concluiu o polícia — em St. Simeon, onde declarou residir, conforme consta na companhia de aviação, não existe ninguém com esse nome.
O Capitão Matte, sem tardança, entrou no carro e a toda a velocidade deslocou-se para o aeroporto, a fim de entender-se com o despachante Willie Lamonde.
Lamonde recordou-se. A bagagem fora trazida por uma mulher robusta, vestida de preto. Descera de um táxi quando faltavam apenas cinco minutos para a descolagem. No pacote se lia: “Frágil — estatueta”.
Esta mulher de preto, mesmo que não fosse a verdadeira culpada, conduziria a polícia ao criminoso.
Ao Detective Guillette e à sua equipa competia agora uma segunda tarefa: esquadrinhar todas as garagens até encontrar o carro em que viajara a mulher de preto.
Paul Pelletier, motorista, lembrava-se perfeitamente da passageira; ele até a ajudara a carregar um embrulho, que pesava pelo menos quinze quilos. A mulher de preto voltara no seu táxi.
— E, — informou o motorista — não me esqueci do local onde ficou; ela mora num bairro populoso da cidade baixa.
A casa indicada pelo profissional do volante era ocupada por Mrs. Margarite Pitre, de quarenta anos, cuja aparência se ajustava, à descrição dada pelo despachante.
Um relojoeiro de 32 anos de idade, Albert Guay, era um de seus visitantes fortuitos e, por estranha coincidência, uma das passageiras do avião sinistrado era a sua esposa, Rita Guay, de 28 anos de idade.
Guay — como foi constatado posteriormente — comprara-lhe uma passagem de ida e volta, e feito um seguro de vida, durante o voo por dez mil dólares.
Novos aspectos deste personagem foram surgindo à medida que a polícia aprofundava as investigações. O seu casamento não era feliz como parecia e ele fora abandonado por Marie-Ange Robitaille, a sua linda amante de apenas dezassete anos.
— Guay queria por todos meios convencer-me a voltar para a sua companhia. — Confidenciou Marie-Ange ao Capitão Matte — mas ele era casado e, nessas condições, nosso idílio não podia continuar.
Até então, as investigações tinham sido conduzidas com a menor discrição; daí em diante, porém, essa táctica foi abandonada: a imprensa, posta a par das verdadeiras causas da tragédia, noticiou com grande alarde o pavoroso crime, assinalando que a polícia estava na pista de uma de uma dama de preto e esperava detê-la em breve.
O objetivo do Capitão Matte era estabelecer o pânico entre os implicados, persuadido de que pelo menos um deles daria um passo em falso.
O plano -deu resultado, mas de um modo diferente do que esperava a polícia. Os detectives encarregados de vigiar a casa de Mrs. Pitre anotaram uma rápida visita de Guay e, logo em seguida, a de um parente da dona da casa, que pouco se demorou, saindo apressadamente em busca de um telefone. Pediu socorro, com urgência, para Mrs. Pitre, caída no leito, contorcendo-se em dores por ter ingerido um veneno. Durante dois dias, Mrs. Pitre ficou inconsciente num hospital.
Quando recuperou a saúde, o Capitão Matte induziu-a facilmente e contar a verdade.
— Comprei o explosivo a pedido de Guay — confessou a dama de preto — que me assegurou ser destinado a nivelar um terreno. Também por solicitação de Guay, o meu irmão, que é relojoeiro, fabricou-lhe uma engrenagem destinada a ser associada ao explosivo e que poderia determinar a hora da explosão. O meu irmão chama-se Généreux Ruest e está inocente. Não sabia para que serviria seu engenho. Também a pedido de Guay, levei o pacote ao aeroporto. Ele prometeu perdoar-me uma dívida caso eu o fizesse.
A 23 de Setembro, duas semanas depois da explosão, o Provincial Ponce Constable Leo Fontaine, efetuou a prisão de Guay, que no dia seguinte foi denunciado como autor da morte da sua esposa.
O julgamento durou três semanas. Guay, condenado à morte, foi enforcado a 12 de Janeiro de 1951.
A despeito de todos os esforços da defesa, Mrs. Pitre e seu irmão também foram acusados de homicídio e condenados.
Ela foi enforcada em Janeiro de 1952 e seu irmão foi conduzido ao patíbulo seis meses mais tarde.
TEMA — ESTUDOS DE LITERATURA POLICIÁRIA — HARRY DICKSON
Texto de Gérard Dôle*, tradução de M. Constantino
Desde há tempos, as extraordinárias Aventuras de Harry Dickson, o Sherlock Holmes americano, editadas em fascículos de papel grosseiro, com uma com tipografia lamentável, todavia com umas assombrosas capas ilustradas, são inacessíveis a um amplo público.
Alain Resnais para ultrapassar a raridade destes fascículos, não teve dúvidas em filmá-las, em 1956, junto com os manuscritos, impressos antigos e os verdadeiros tesouros comuns àqueles encontrados na Biblioteca Nacional, num excelente documentário de 22 minutos intitulado: “Toute la memoire du monde” (Toda a memória do mundo).
O tiro de partida havia sido dado. A recordação de obras impossíveis de encontrar, quase míticas, sugeria o desejo compartilhado para as suas reedições. Isto foi o que empreenderam ao longo dos anos as edições Marabout, Champs-Elysées, Corps 9 e Néo.
Agora vejamos; a série francesa Harry Dickson (houve efectivamente uma série holandesa que a precedeu dois anos), foi certamente o conjunto mais estranho de textos referentes ao mesmo personagem da literatura popular. Porque, se não nos equivocamos Jean Ray nunca foi o criador de Harry Dickson.
Ele mesmo o admitiu perante Alain Resnais em 1959, que não havia inventado este personagem e que nunca soubera, quando, como e por quem Harry Dickson havia sido criado, e voltou a dizê-lo pouco antes da sua morte, numa emissão passada recentemente na televisão belga.
As diversas investigações efetuadas desde há alguns anos, permitem-nos hoje em dia, afirmar que o personagem de Harry Dickson é o resultado de uma longa cadeia criativa em que Jean Ray foi um dos seus elos.
No princípio encontramos Sherlock Holmes, o arquétipo de detective criado por Conan Doyle, o qual, por sua vez, se Inspirou no cavalheiro Dupin, de Edgar Poe. Depois, em 1907, e concretamente em Berlim, apareceu a série “Der Welt-Detektive” — O Detective Mundial. Ainda que relatando os pobres êxitos de um detective que somente fazia seu o nome do herói de Conan Doyle, esta série obteve, não obstante, um êxito formidável na Alemanha e depois no mundo Inteiro.
Foi traduzido e editado em países tão diferentes como a Hungria, Noruega, Itália, Espanha, Portugal, México e França. Depois da 1ª Grande Guerra, estando o fenómeno Sherlock Holmes em palpitante actualidade, os editores alemães publicaram várias vezes nos anos vinte, umas séries de aventuras de “Der Welt-Detektive” do seu jovem assistente Harry Taxon.
Em Dezembro de 1927, um impressor-editor de Amsterdão fez traduzir para o holandês os textos alemães de “Der Welt-Detektive” e rebaptizou-os de Harry Dickson, apoiando-se evidentemente no nome do aluno Harry Taxon e preparou-se para pôr um dia: “Sherlock Holmes Americano”.
Faltava conquistar a França e a Bélgica e suas colónias, traduzindo estes Harry Dickson holandês, em língua francesa, o que começou em 1929.
Obscuros tradutores, alternam-se neste trabalho sem glória. Depois de Jean Ray, que devido a diversos reveses da sorte, viu-se obrigado a aceitar tudo o que se lhe apresentava, traduziu por sua vez do holandês ao francês, as aventuras de Harry Dickson. Um dia, sem dúvida, cansado de traduzir, Jean Ray passou sem transição na metade do segundo capítulo da história intitulada “Le Tresor du Manoir de Streetham” (nº64), da simples tradução à pura criação. Tomando como referência as ilustrações das capas dos fascículos de Harry Dickson da série holandesa, Jean Ray, inventou intrigas originais, excepto em alguns casos, em que existiam traduções francesas de antes da guerra de certos números da série alemã.
Em resumo, em 178 fascículos de Harry Dickson, encontramos:
- Textos alemães anteriores a 1914, traduzidos depois da guerra para o holandês, e depois para o francês, traduzido por anónimos;
- Textos alemães anteriores a 1914, traduzidos depois da guerra para o holandês por tradutores anónimos, sendo traduzidos para o francês por Jean Ray;
- Textos alemães anteriores a 1914, traduzidos para o francês entre 1907 e 1908 por Fernand Laven e novamente utilizados por Jean Ray;
- Textos originais, escritos directamente em francês por Jean Ray.
Certamente um quebra-cabeças chinês, esta série de Harry Dickson. Agora compreende-se porque de início, escrevíamos que este compêndio de textos, diferentes entre os que existem, é também o mais raro da literatura policial francesa.
(*) Gérard Dôle, homem de letras especializado em literatura fantástica e autor, de entre outros, das Novas Aventuras de Harry Dickson, é presidente de “Le Cércle des eléves de Harry Dickson”(C.E.H.D.), fundado em Fevereiro de 1984, limitando-se estritamente a 178 membros (tantos quantos os fascículos com o personagem).Não é uma sociedade sherlockiana.
Publicações desta associação: 9 obras de Maio/84 a Outubro/88; bem como alguns números especiais destinados exclusivamente aos sócios.
Sem comentários:
Enviar um comentário