8 de março de 2012

CALEIDOSCÓPIO 68

EFEMÉRIDES – Dia 8 de MarçoJohn Burke (1922 – 2011)
John Frederick Burke nasce em Rye, Sussex, Inglaterra. Escritor e editor, dedica-se à escrita em 1966. Usa diferentes pseudónimos: J F Burke, Jonathan Burke, Jonathan George, Joanna Jones, Martin Sands, Owen Burke, Robert Miall, Roger Rougiere, Russ Ames e Sara Morris. Nos 3 livros de mistério/detective passados na época vitoriana, que escreve com a mulher, Jean (Williams) Burke, utiliza o pseudónimo Harriet Esmond. Tem uma extensa obra publicada, em especial contos de mistério, de suspense, de terror e de ficção científica. Na sua bibliografia destacam-se os 31 romances policiários escritos sob John ou Jonathan Burke com o personagem Dr. Casian, um investigador da Época vitoriana. O escritor tem várias obras adaptadas ao cinema e televisão.


Leif Silbersky (1938)
Leif Silbersky nasce em Malmö, Skåne, Suécia. É um dos advogados suecos mais conhecidos, em especial por defender casos polémicos que envolvem personalidades famosas. Escreve com Olov Svedelid, uma parceria prolífica que entre 1974 e 2002 publica mais duas dezenas de livros policiários. O romance mais conhecido é The Last Witness editado no Reino Unido em 1979 e com o título original Sista Vittnet (1977).



TEMA — CONTO POLICIÁRIO – MORTE NO CAIS
De A.M. Breda in XYZ Magazine
Naquela noite o cais era tranquilidade e escuridão. Os barcos quase quietos, dormitavam despreocupados. Só lá ao longe, no fim da doca, um candeeiro emanava uma fraca luz de presença. Num certo ponto da doca, três homens de pé, tácitos, olhavam para o mar.
— Que raio! — exclamou baixinho um dos homens.— Se ao menos pudéssemos fumar. — Chiu! — interrompeu outro. — Sinto alguém aproximar-se.
Calaram-se.
Lentamente, um vulto ia emergindo da escuridão. Deu mais alguns passos, e parou:
— Está aí alguém? — perguntou sussurrando.
— Até as gaivotas voam… — responderam do grupo.
— Se não lhes cortarem as asas — concluiu o recém-chegado
— É ele! — concordaram no grupo.
— Trazes a mercadoria?
— Está no “Boa Esperança”.
— Então, vamos ao negócio.
Caminharam ao longo do cais. Habituados à escuridão, as feições dos homens e os seus movimentos, tornavam-se mais reconhecíveis.
— Eh!, alto aí, seu canalha! — bradou um do grupo apontando uma arma ao visitante.— Você não é o “Sobe e Desce”. Ele é coxo e você anda correctamente.
— E daí? — interrogou com naturalidade o interpelado.— Foi substituído por mim. Não houve tempo para vos avisar.
— Não me levas com essa. Conheço todos os elementos da organização, e a tua cara é a primeira vez que a vejo. Pensavas que estavas protegido pela escuridão, não era?
— Ora, não sejam loucos. Venham ver…
Não acabou a frase. Alguém aproximara-se pelas costas, e cravou-lhe um punhal.
— Que fazemos com este tipo?
— Espera. Está aqui um bote amarrado ao cais. Deitamo-lo lá dentro e largamos o bote. Como a maré está a vazar, levá-lo-á para o mar alto. Se alguém o encontrar nunca o relacionará com este local.
— Apoiado. Mãos à obra.
— E a droga?
— Ainda acreditas nisso? Era uma cilada para nos encurralar no pesqueiro.
E afastaram-se rápidos.
Caminho cauteloso pela doca. Tudo é silêncio e escuridão. Apenas o soluçar das águas quebradas se fazem ouvir na noite. Avança alguns metros e… silêncio. Um silêncio que começa a causar-me preocupação.
Estou agora no local combinado. De novo, silêncio, água e os espectros de alguns barcos pesqueiros ao longe, balançando docemente, como encantados por não haver faina nessa noite.
Não. Não era só silêncio que eu esperava encontrar. Isto é presságio de que algo correu mal. Sim, a esta hora, três da manhã, com um silêncio perturbador, só duas coisa poderiam ter acontecido: ou a operação ainda não se realizou, mas neste caso deveria encontrar-se aqui o meu colega de ofício, o que não acontece, ou então, a operação efectuou-se mais cedo e ele foi descoberto. Se isto aconteceu, nem quero acreditar. Estava tudo planeado até ao mais ínfimo pormenor. De repente, lá vem o último telex: o intermediário é coxo. Não, não acredito nesse desfecho.
Continuo andando. Agora sinto a água mais agitada, num dos lados da doca. Curioso, abeiro-me da margem do cais. Está escuro. Num gesto rápido, acendo a lanterna.
Surpresa!!
Um bote dançava desgovernado. A corda que servira de amarra, mergulhava verticalmente na água. Não perco tempo. Procuro uma vara com a extremidade em foice, própria para puxar embarcações.
Sei que costuma haver algumas nestes sítios. Puxo o bote de encontro ao cais. Salto para dentro e tento puxar a corda que está presa ao fundo. Acendo novamente a lanterna. Um fogacho de luz ilumina o interior do bote, ao mesmo tempo que solto uma exclamação. Reconheço a letra do meu colega. Uma das tábuas dizia o seguinte: “os traficantes são cadastrados. Os códigos são: 33A, 4B1 e Z24E.
Intuitivamente puxo com força a corda, que vai cedendo a pouco e pouco. Tristemente, já adivinho o que vau encontrar: o corpo do meu colega.
É verdade!
“Malditos”, pensei.
Descobri o golpe nas costas. Compreendi tudo.
O meu amigo sentindo a morte aproximar-se, e sabendo que o bote se afastava devido à baixa-mar, atou à corda uma barra de chumbo que estava no bote, e utilizando a mesma corda, atou-a de seguida à perna, e atirou-se à água. Servira de âncora.


TEMA — O CRIME NA LITERATURA NÃO POLICIÁRIA – CIÚME QUE MATA
Texto de Rosa do Adro de Manuel Maria Rodrigues
Por volta da meia-noite…
— Mas, meu amigo, isto não são horas de ir ver doentes, além disso, o filho do nosso amo está, talvez, a dormir, e ir agora acordá-lo…
— Não será necessário esse trabalho — exclamou Fernando, aparecendo subitamente junto do grupo.
— É de algum doente que se trata, não é verdade?
— É sim, meu bom senhor — respondeu o velho, curvando-se mais — a minha pobre mulher foi à pouco atacada por um infeliz acidente ou coisa que o valha, e jaz sem sentidos há já bastante tempo. Fui procurar o Dr. Resende, mas ele negou-se a ir vê-la. Como sabia que o senhor tinha vindo há dias de concluir os seus estudos, lembrei-me de recorrer ao seu bom coração e é o que venho fazer.. Oh meu senhor, por que é, minha mulher morre à mingua de socorro.

O moço doutor montou e picou a égua, que desfilou a trote…
Enquanto Fernando caminhava por aquelas veredas, retrocedamos um pouco e vejamos o destino que tomou o velho logo que daquele se despediu.
Depois de ter caminhado alguns passos vagarosos, afastando-se da herdade, parou, e, olhando para trás. como para se certificar se alguém o seguia, endireitou-se, deixando ver uma figura de formas vigorosas. Traçou o capote debaixo dos braços, como para melhor poder caminhar, e, dirigindo-se pelo mesmo itinerário que tinha marcado a Fernando, com passos mais apressados, exclamou de si para consigo:
— Desta me saí eu bem; agora vejamos o resto.
Passou a azenha, desceu a encosta e, no meio da bouça, parou para responder com um assobio a outro que lhe chegara aos ouvidos. Afastou-se depois do caminho, deitou à direita e parou próximo de um vulto que estava encostado a um pinheiro bravo.
— Então? — perguntou o outro.
— Tudo às mil maravilhas: tanto ele como os criados engoliram a pílula como um torrão de açúcar.

Os dois avançaram precipitadamente para mais próximo do caminho que cortava a bouça e encobriram-se um tronco de um velho carvalho.
Passados momentos, distinguiu-se um ponto negro caminhando vagarosamente.
Era Fernando que, embuçado na sua capa de oleado e montado na égua, atravessava pausadamente e à vontade do animal, a embrenhada bouça.
A poucos passos do lugar em que estavam embuçados, a égua estacou, amedrontada pela detonação de um tiro.
— Ah! seus canalhas! Eu vou já ensiná-los a fazer melhores pontarias…
Ainda bem não tinha terminado estas frases, quando um segundo tiro se fez ouvir, indo a bala ferir-lhe o ombro direito…
Passados momentos, os dois vultos acercaram-se do corpo que jazia inanimado, e um deles baixou-se a ouvir-lhe o bater do coração.
—Se ainda não está morto — exclamou ele — pouco faltará para isso; a bala creio que lhe foi direita ao coração; podes gabar-te da boa pontaria…

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