Efemérides 26 de Outubro
Vincent Starrett (1886 - 1974)
Charles Vincent Emerson Starrett nasce em Toronto, Ontario, Canadá. Novelista, contista, poeta, ensaísta, crítico, biógrafo, famoso coleccionador de livros sobre Sherlock Holmes, é um dos fundadores da Baker Street Irregulars, uma organização de fãs de Sherlock Holmes. Em 1929 inicia uma série Murder On “B” Deck com Water Grost como figura principal; em 1938 o personagem Riley Blackwood aparece em Midnight And Percy Jones. Tem uma série de excelentes contos personalizados por Jimmie Lavender, muitos deles publicados na pulp magazine Short Stories. A obra de Starrett mais famosa é The Private Life Of Sherlock Holmes (1933).
Charles B. Child (1903 - 1993)
Claude Vernon Frost nasce em Londres. Jornalista e autor policiário, escreve o primeiro livro, The Crime On The Heath, em 1937 que assina como C. Vernon Frost. Sob o pseudónimo Charles B. Child escreve vários contos protagonizados pelo Inspector Chafik J Chafik da polícia de Bagdad (ver TEMA); estes contos, cuja acção decorre sempre no Iraque — país onde o autor vive vários anos— começam a ser publicados a partir de 1947 na Colliers Magazine e são finalmente reunidos num livro publicado em 2002 com o título The Sleuth Of Baghdad. Em Portugal é possível encontrar registo do conto conto Matem Esse Palhaço! publicado em 1964, em 50 Gigantes do Conto Policial, nº6 da Antologia Policial de Ross Pynn.
TEMA — CONTO DE VINCENT STARRETT — LER NAS ENTRELINHAS
— É a letra dele, não tem dúvida — disse Jimmie Lavender. — A sua mulher assim o afirma, e o mesmo faço eu. Portanto trata-se de uma opinião unânime.
— Dodd acha que se trata de uma falsificação, apesar de tudo — observou Mack, o repórter do Departamento de Homicídio. — E uma pobre imitação do tipo de humor do Professor.
— Óptima imitação — volveu Jimmie Lavender — É claro que foi forçado a escrever.
— Isso é o que querem que se pense, de qualquer forma — disse o corpulento Mack.
Jimmie Lavender acomodou-se entre os travesseiros da sua cama de hospital e tornou a ler a carta.
— Ele procura dizer algo nas entrelinhas — murmurou Lavender. — Naturalmente não podia escrever: “Estou prisioneiro na Gooseberry Street, 1129. Apressem-se e venham salvar-me, pois de contrário dão-me cabo da pele”. Uns camaradas bastante espertos releram o bilhete antes de enviá-lo a Mrs. Buckner. E precisamos de sobrepujá-los em inteligência, a fim de descobrir o que ele está a tentar dizer.
Jimmie atirou a cabeça para trás, nos travesseiros.
— E eu preso aqui com uma apendicectomia. Vocês darão um jeito nisso?
Mack resolveu mostrar a sua solidariedade:
— Dodd achou que se alguém podia entender a coisa, esse alguém só podia ser você, pois conhece o professor Buckner muito bem, não é?
— Conheço-o o bastante para saber que não escreveu essa página de tolices apenas para brincar connosco. Leia em voz alta, Mack, talvez eu apanhe qualquer coisa.
O sorriso do detective da polícia encheu-se de malícia.
— Querida — começou com exagerada emoção — esta serve apenas para te dizer que estou bem por enquanto. Mas não sei o que acontecerá se não seguires à risca as minhas instruções. É imprescindível que não leves esta carta à polícia, pois de contrário jamais me verás. E eles não brincam neste particular. Quero que tires um envelope azul do meu arquivo, sabes bem onde procurar, para mandá-lo via aérea ao endereço que te vou fornecer. Não te assustes. Como tia Bessie costumava dizer: “Colombo arriscou-se e eu farei o mesmo”. Falo em tia Bessie e na sua frase predilecta para te provar que esta carta partiu realmente de mim. Quero que também te arrisques, querida e mandes o envelope, o mais depressa possível. É a minha única esperança. Assim que for entregue serei posto em liberdade.
— E é tudo — disse Mack — com excepção do endereço, no México. Acha mesmo que vão levá-lo para o México?
— Absolutamente, — retrucou Jimmie Lavender— Matam-no assim que forem avisados que a carta aérea chegou. Mas é claro que ela não irá. O envelope azul deve conter a chave de uns planos já roubados. A mensagem para nós está contida nas linhas a respeito de tia Bessie e na alusão a Colombo. Creio que as linhas têm qualquer ligação com a linha anterior “o endereço que te vou fornecer.” Isso deve ter dois sentidos. Miss Buckner ficou tão assustada que quase não nos mostrou a carta. Mas não conseguiu encontrar o envelope azul e não sabia o que fazer.
— Talvez não exista nenhum envelope azul — volveu Lavender lentamente. Reflectia com profunda atenção. — Sim, talvez não exista nenhum envelope azul. Isso foi invenção dele para que lhe permitissem escrever a carta. Mrs. Buckner, nunca teve uma tia chamada Bessie.
— Nunca teve tia nenhuma que fizesse tal referência a respeito de Colombo. É por isso que acha que o Professor enlouqueceu.
— Louco como uma raposa…Talvez eu também esteja louco, Mack, mas… qual é o outro nome de Bessie? Betty, Betsy, Elizabeth, Lizzie…
— Elizabeth — murmurou Lavender. — Não é apenas o nome de uma mulher. É também o de uma rua. Aí está o ponto de partida para uma rua, Mack, tão certo como você tem um pé de altura!
O detective da polícia encolheu de ombros.
— Bastante forçado, não acha?
— Claro que sim. Porém é bastante simples também. O Professor estava a arriscar a vida, e sabia disso. E usou do máximo cuidado; mas tinha de nos dizer onde é que se encontrava.
— Ok. — concordou Mack com um sorriso. — Pode ser e não é difícil de experimentar. Mas há um mundo de casas na rua Elizabeth. Quem sabe se, dando o nome da rua, não nos deu também o número da casa?
— Claro que sim — retrucou Jimmie Lavender. — E escreveu-o bem debaixo do nariz deles. Há duas notas falsas naquela carta, tia Bessie e…
— Colombo! Ora, ora, vejam só
Jimmie Lavender tentou estender o braço, sentiu uma picada no abdómen e disse:
— Chegue-me aqueles cigarros em cima da mesa, sim, Mack? — Acendeu um deles, a sorrir muito satisfeito. — Escute, Mack, que data associa ao nome de Colombo?
— Oh, ohl — retrucou Mack, repentinamente, em voz baixa, lançando um olhar nervoso para a porta, começou a cantar Em mil quatrocentos e noventa e dois, Co-lombo navegou pelo mar azul. É isso mesmo, Mr. Lavender
— Pode ser — concordou Lavender. De qualquer forma vale a pena tentar. Precisamos fazer algo pelo Professor. Volte depressa para a Esquadra e passe pela rua Elizabeth 1492. Diga a Dodd que leve um esquadrão reforçado. Reclinou-se nos travesseiros, depois tornou a sentar-se. — E telefone-me assim que puder, Mack. Santo Deus! Eu preso aqui cama, e todo este rebuliço.
Durante muito tempo ficou deitado, serenamente. De repente o telefone à sua cabeceira tocou e, surdina.
Era Dodd, o chefe dos detectives, e por alguns instantes Jimmie pensou que o chefe estivesse embriagado. Depois percebeu que o homem cantava num tom baixo profundo, lembrando um comboio a chegar à estação de Madison e Wabash. Apanhou algumas das palavras:
— e noventa e dois, Colombo navegou pelo mar azul. Em mil quatrocentos e novena…
Concluiu então que tudo estava bem com o Professor Buckner e com o envelope azul — se é que realmente existia tal coisa.
TEMA — UM PERSONAGEM DE CHARLES B. CHILD — O INSPECTOR CHAFIK
Inspector da Polícia de Bagdade, no antigamente, Chafik J. Chafik, era um homem delgado, baixo, muito moreno, olhos grandes cor de azeitona madura — em geral despidos de qualquer emoção, excepto para a família — maçãs do rosto pronunciadas, nariz fino e aristocrata de uma pessoa cuja história está enterrada sob a lama e pó da terra do seu nascimento, dedos finos, no dedo mínimo brilha um anel sinete, que por vezes roda impaciente. Vestia com discrição bum casaco branco, imaculado, leve e o chapéu preto cobria-lhe a cabeça de cabelos lisos, meticulosamente penteados, e usa gravata de borboleta. Mora na Rua dos Distribuidor das Bênçãos, é casado com a deliciosa e meiga Leila, de cabelos negros. Tem um filho adoptivo, o irrequieto Faisal, de que se orgulha muito.
Tem por ajudante, companheiro e braço direito o sargento Abdullah, um homenzarrão forte e destemido, fiel adorador do seu amo; de uniforme caqui, rosto como que esculpido em madeira, destituído de expressão, que arrasta a devoção a ponto de ficar, na noite escura no quintal da família Chafik, para caçar eventuais escorpiões e cobras que possam incomodar, se bem que o seu superior lhe faça sentir que “o tempo de escravatura já acabou”.
Chafik confessa-se “ como polícia no cumprimento do dever sou impuro e os meus ouvidos profanos”. Acha que “ não sendo um homem bom, Deus proteje-me por motivos insondáveis”. É diligente e eficiente, por vezes audaz em demasia na caça aos criminosos. Tem uma memória excepcional só compatível com um moderno computador, pois conhece de cor as fichas dos mais proeminentes habitantes, positivos e negativos, da cidade. Conhece o Alcorão que cita apropriadamente. Gosta de fumar e raciocinar em voz alta — de que se recrimina, por a sua língua “ser de uma criança tagarela”.
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