6 de outubro de 2012

CALEIDOSCÓPIO 280

Efemérides 6 de Outubro
Stanley Ellin (1916 - 1987)
Stanley Bernard Ellin nasce em Brooklyn, New York, EUA. É considerado como um escritor chave do pós guerra da narrativa policiária (ver TEMA). A obra do escritor foi distinguida com os prémios Edgar Award para Best Short Story em 1955, 1957 respectivamente com The House Party e The Blessington Method, e 1959 na categoria Best Novel com The Eighth Circle; em 1960, 1964 e 1969 é nomeado para a Best Short Story, respectivamente com The Day Of The Bullet,The Crime Of Ezechiele Coen e The Last Bottle In The World e também em 1969 é nomeado para o Edgar Best Novel com The Valentine Estate. Em 1974 recebe o Grand Prix de Littérature Policière com o romance Mirror, Mirror, On The Wall (1972). Stanley Ellin é presidente de Mystery Writers of America em 1969 e é laureado, em 1981, com o galardão máximo desta associação: o Grand Master Award. Em Portugal há apenas registo da edição do romance:
1 – A Chave Dourada (1955), Nº46 Colecção Xis, Editorial Minerva. Título Original: The Key to Nicholas Street (1952).


TEMA — ESTUDOS DE LITERATURA POLICIÁRIA — STANLEY ELLIN, UM VENCEDOR
Por M. Constantino
Com a primeira novela em 1948, Dreadful Summit ou The Big Night, Elllin conquistou um lugar de vencedor entre os escritores. Caracterizado por um estilo sólido e fluente, por argumentos onde ressalta a substância e a imaginação criativa, enquadra-se com alguns voos poéticos na classe da literatura de psicologia criminal (crime psychology), a denúncia social, não isenta de golpess de horror ou fantasia. A intriga e a sublimação do “suspense” pertencem ao seu campo de acção. Ocasionalmente, como em Star Light, Star Bright (1979) ou The Dark Fantastic (1983) ou, ainda Very Old Money (1984) aparece o detective privado, da sua criação, John Milano. Não desdenha o enigma sem solução.
É especialista apreciado na novela curta e no conto. Imensos números dos seus escritos têm sido a cinematografia e séries de televisão. Um vencedor!

Stanley Ellin


TEMA — ESTUDOS DE ENIGMÍSTICA POLICIÁRIA — SOLUÇÃO DO ENIGMA A MORTE DE UM TIRANO
Solução
A questão resume-se em conhecer qual o veneno que, ingerido no mesmo alimento (salada) pelo coelho e pelo homem, tem a propriedade de conceder a morte a um e a vida ao outro.
A sintomatologia verificada na morte do rei aponta-nos para um veneno à base de atropina (diminuição da acuidade visual, midríase, secura na boca dificuldade de deglutição - rigidez dos membros, delírio, coma…).
Não eram conhecidas naqueles tempos as ervas ou plantas que continham essa substância. Eram usadas em espécie, para os mais díspares exercícios de magia ou bruxaria, envenenamento, remédio, porque se ignorava a extracção da essência.
Entre tais sobressaía a mandrágora propriamente dita e a beladona, conhecida então por mandrágora do monte, por ter os efeitos daquela, mas muito mais fortes. Só que também existe entre elas mais uma analogia - ambas podem ser ingeridas pelo coelho sem prejuízo deste, sendo mortal para o homem; e uma diferença muito grande - a beladona é tolerada pelo coelho e não distinguível pelo homem (daí a razão de muitos envenenamentos por acidente), ao contrário da mandrágora, cujo sabor é amargo e tão mal cheirosa que se torna reconhecível por ambos.
A conclusão é lógica: envenenamento por beladona!
De resto, a própria bandeira - “coelhinho branco sobre um feixe de mandrágoras do monte” - contém a “chave” indirecta do problema.
Ao referir-se a mandrágora está a referir-se a beladona, nome aquele por que, repete-se, era conhecida a beladona = “Strychnos, mandrágora, erva-moura, furiosa e mortal".
Poderia indicar-se que o coelho, por instinto, comeu a alface e evitou a mandrágora. Correcto. Simplesmente, pelo sabor e cheiro desta, seria igualmente evitada pelo rei.


Continuando
Não poucas vezes o envenenamento é disfarçado pela medicação, tornando-se, nestes casos, muito mais difíceis de localizar.
Aqui fica um exemplo.


ENIGMA PRÁTICO — O CASO DA MORTE DO MAGNATA
Publicado em XYZ Policiário, não encontramos o nome do autor.

O Inspector Lopes foi chamado porque apareceu morto no seu quarto o grande magnata da indústria automóvel, Sir Henry Lane.
Em princípio, todos os ocupantes da casa atribuíram a causa da morte a um ataque cardíaco, pois Sir Henry sofria, já há alguns anos, do coração; contudo o meu chefe mandou-me averiguar e talvez confirmar…
Ao entrar fui recebido pelo sobrinho da vítima que me conduziu de imediato ao quarto do falecido. Este encontrava-se deitado na cama, sem qualquer marca de agressão, ou mesmo morte violenta. (Pelo menos, aparentemente, não se notava nada).
Sobre uma mesa-de-cabeceira via-se um frasco quase vazio que, segundo o rótulo, continha digitóxina; poderia ainda ver-se uma seringa e umas ampolas dentro de uma caixa, que me disseram ser para a gripe, para acalmar as altas temperaturas — o que pouco depois confirmei pelas indicações da caixa e das próprias ampolas; no entanto, a caixa encontrava-se intacta, ou seja com todas as suas ampolas… mas de qualquer maneira a seringa havia sido utilizada.
Resolvi-me interrogar todas as ocupantes da casa
Dora Lane — esposa da vítima — Sim, meu marido sofria do coração já há alguns anos; ainda anteontem se comprou o remédio que ele anda a tomar conforme receita do seu médico, que todos os dias lho ministra, exceptuando hoje, que telefonou por não poder comparecer, mas que meu sobrinho, que é um bom médico, lho poderia ministrar. Meu sobrinho, apesar de médico e de ser para nós como um filho, visto que nunca tivemos nenhum, nunca mais quis ser o médico do tio alegando que isso representava uma grande responsabilidade para ele e que o actual médico de meu marido também era um grande médico, pois até fora indicado por ele, e era na realidade uma pessoa competente para tratar de seu tio. E foi assim que meu sobrinho, hoje, perto das 22H00, foi ministrar os medicamentos a seu tio; levou da casa de banho os medicamentos habituais, ou seja a caixa das injecções para a gripe, uma caixa cheia, e ainda o remédio que comprámos ontem para o coração; levava também uma ampola que segundo ele afirmou era para a gripe e que tinha restado da caixa anterior.
Pelas 23H00 estava aqui a conversar com meu sobrinho e já prestes a ir deitar-me quando oiço a criada aos gritos. Fomos ver o que se passava e encontrámos o meu marido tal como está agora…
Criada - Pelas 22H00 o Sr. Artur foi ao quarto do patrão para lhe dar os remédios, pois eu vi-o ir pela escada acima para dar uma injecção no tio que se encontrava com gripe e bastante febre.
Na realidade, o Sr. Henry já ao jantar afirmara encontrar-se constipado e com febre, pelo que a seguir ao jantar resolveu ir logo deitar-se, deviam ser 21H00; ele estava um pouco pálido, mas nada fazia prever que viesse a ter um ataque logo depois de tomar os medicamentos, pois quando entrei pelas 23H00 e chamei pelo patrão para lhe perguntar se precisava de alguma coisa como faço todas as noites antes de me ir deitar, ele já estava morto, pois por não obter resposta ao meu chamamento entrei, aproximei-me e verifiquei que realmente estava morto.
Corri imediatamente a chamar a patroa e o sobrinho que estavam na sala a conversar.
Artur Lane — sobrinho da vítima — Sim, fui eu, hoje, pelas 22H00, que ministrei os remédios ao meu tio, mais propriamente a digitóxina, e dei-lhe também uma injecção, pois ele encontrava-se com muita febre; como tinha restado uma ampola da outra caixa, trouxe-lhe uma inteira que ficaria aqui para o caso de vir a ser precisa e ministrei-lhe a que restara da caixa anterior.
Ele ficou a descansar e eu desci e estava a conversar com a minha tia quando a criada apareceu aos gritos a dizer que o meu tio estava morto.
Informaram-me que os medicamentos estavam na casa de banho e aproveitei para dar uma vista de olhos… Lá estavam o mercúrio, a água oxigenada, o algodão, o álcool e ainda dois pequenos espaços que me informaram ser da digitóxina e das injecções e que se encontravam agora lá em cima… Depois pedi para saírem, pois tinha de fazer um teste, e logo que saíram debrucei-me sobre o caixote e pus-me a ver o que continha… Ligaduras que haviam sido usadas, um bocado de algodão que havia sido embebido em álcool e que continha ainda um vestígio de sangue, alguns pensos rápidos que também haviam sido usados, e ainda uma cápsula vazia onde pude ler noradrenalina e também a indicação 1,5mg.
Depois saí, já tinha uma ideia do que havia acontecido, e voltando-me para os três personagens atirei-lhes de chofre: “O Sr. Henry não morreu de ataque de coração, foi assassinado!
1 - Quem matou Henry Lane?
2 - Explique pormenorizadamente o que aconteceu!


TEMA — PEQUENO CONTO DE FICÇÃO CIENTÍFICA — O SOM
De Belém Vintém
Após um dia cansativo, e de tensão nervosa, a noite surgia sempre todas as noites, como monumento à solidão impedida diurnamente por colegas de rotina, caminhando, lado a lado na destruição comum.
Agora só, no quarto da sua casa de três divisões, daquele 10º andar, lá estava ele na cama encostado. À sua volta papel, pontas de feltro, dois livros, um transístor. No entanto nada fazia, pensava… sem noção do seu pensamento; não escrevia, não lia, não ouvia rádio. À medida que o tempo ia passando, e já eram três da matina, continuava sem conseguir descansar, embora fatigado, e cheio de sono, faria tudo menos dormir. Desde quando dormir num estado de espírito tão turbulento!? — Certamente que poderia escrever ou ler, como procurara fazer inicialmente, mas a preguiça, indiferença ou o que lhe queiram chamar, impedia-o.
A rádio ainda era o melhor! Lentamente esticou os braços que mantivera cruzados e com a mão direita apanhou o aparelho. Após ligá-lo, Veio a música, quer fosse jazz, rock ou blues não interessava; era música e, a esta hora, publicidade e piadas imbecis de locutores eram coisas que não existiam. Fechou a luz, para assim melhor passar o tempo…
Momentos depois, subitamente, um som emergiu da escuridão, ao mesmo tempo que a rádio deixara de se fazer ouvir; esta nova e mágica sensação auditiva encantava-o.
O som inicialmente fraco, ia a pouco e pouco aumentando a sua cadência e intensidade; encantado e surpreso primeiramente e, curioso depois, pôs os pés no chão e levantou-se. De onde viria o som?
— Parecia provir de todos os lados e, simultaneamente, de nenhum… Do quarto não era, foi a conclusão a que chegou; faltava a sala, a outra divisão e a cozinha. Da cozinha também não era… por fim faltava só a sala… Lá entrou; tudo lhe desapareceu já antes lhe parecera sentir-se nas nuvens e obcecantemente o som, o som, o som, só o SOM…
Parecia vir do que agora julgava ser, ou ter sido, a janela; tinha de abri-la, urgia, assim o fez… Então o som surgiu com toda a sua plenitude e, para seu maior espanto, à sua frente surgia aquilo que ele mais ambicionara em toda a sua vida… Lá estava, ali mesmo numa projecção, numa existência tridimensional — apenas alguns instantes à sua frente. Tentou apanhar, agarrar, o objecto desejado e caiu, vagueou no vácuo inexistente, perdido… Já não existia.



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