11 de agosto de 2013

RECORDAÇÕES HOLMESIANAS

 
RECORDAÇÕES HOLMESIANAS (6 - 3ª PARTE)
PASTICHE / PARÓDIA —  A AVENTURA DO ESCONDERIJO DE PARADOL
“The Adventure of the Paradol Chamber” é uma pequena peça teatral do famoso escritor John Dickson Carr, incluída na Ellery Queen Anthology, de 1942, “The Misadventures of Sherlock Holmes”, foi representada pela primeira vez em 1949, no encontro anual dos Mystery Writers of America.
Tradução e organização de M. Constantino.
A cena representa a sala de estar de Sherlock Holmes em Baker Street, 221B. Distinguem-se na penumbra dois vultos e o som leve de um violino. Acima de qualquer ruído, o narrador desconhecido procede à leitura:
“Encontro escrito no meu caderno de notas que o caso ocorreu numa tarde do mês de Agosto do ano de 1887. Durante todo o dia, Sherlock Holmes havia estado distraído e de mau humor. Ao entardecer, agarrou o violino e, sentando-se na sua poltrona, com os olhos cerrados, arranhou suavemente as cordas do instrumento. Os sons, ora suaves, ora profundos e melancólicos, cortavam o silêncio”.
As luzes acendem-se, lentamente… Holmes e Watson estão sentados em lugares opostos da sala. O violino termina num suave sussurro. Watson — em êxtase — deixa cair o Daily Telegraph para o chão.
Watson — Caro Holmes, o seu virtuosismo não tem rival. Queira continuar, por favor!
Holmes — Não estou de humor para isto, Watson (põe o violino sobre a mesa e levanta-se). A minha mente está demasiado torturada com esta obsessão.
Watson (divertido) — Não pode ser. Outra vez? È por virtude do Professor Moriarty?
Holmes — È o Napoleão do Crime, Watson Atrevo-me a apostar qualquer coisa, em que encontrará nesse mesmo jornal, que é o primeiro que os seus olhos alcançam.
Watson — Por Deus, Holmes! (pegando no jornal). Está aqui algo curioso!
Holmes — Rápido, Watson, leia!
Watson (lendo) — “Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros, teve um colapso quando se dirigia a Constitution Hill, depois de abandonar o Palácio de Buckingham. Não obstante notícias de última hora afirmam que o seu estado é satisfatório.”
Holmes — Maravilhoso!
Watson (continuando a ler) — “os senhores Lestrade e Gregson, da Scotland Yard, difundiram uma estranha notícia. Lord Matchlock num dia de calor intenso, levava um grosso casaco de lã, colete e gravata Ascot, uma grossa camisa de lã e botas Hassan, por isso…” (reagindo à notícia) Caro Holmes, que mal há nisso?
Holmes — É uma velhaquice!
Watson — Holmes, encontra alguma coisa de estranho?
Holmes — Não levava calças, Watson, Lord Matchlock não levava calças!
Watson (parecendo embaraçado) — Mas isso é maravilhoso, Holmes?
Holmes — Elementar, meu caro Watson! Mas não a falta de sentido; naturalmente a Scotland Yard nunca vê nada.
Watson — Porém, porque ia Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros sem calças?
Holmes (escutando passos) — Aí vem, creio, a chave do nosso problema!
(ouve-se bater à porta)
Watson — Um cliente, Holmes…
Holmes — Talvez traga resposta à nossa interrogação.
(Watson abre a porta e entra Lady Imogene Ferrers num estado de terror mal contido. Traz um embrulho médio em papel de jornal, olha para um e para outro dos homens, finalmente decide-se…)
Imogene — O senhor é Sherlock Holmes?
Holmes (tranquilizante) — Acalme-se, por favor, minha senhora. Watson, uma cadeira para a senhora. (Watson aproxima-se com a cadeira) — uma chávena de chá não lhe fará mal de todo. Parece-me nervosa.
Imogene — É o medo senhor Holmes. É o terror. Eu sou Lady Imogene Ferrers. O meu pai, Lord Matchlock, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Watson (com raiva aparente) — Roubaram as calças ao seu pai?
Imogene — Os senhores devem ser adivinhos! Vim aqui, senhor Holmes, para lhe entregar isto (passa a Holmes um par de calças contidos no embrulho)
Watson — Céus! Um par de calças!
Holmes — São estas as calças do seu pai?
Imogene — Não, senhor Holmes. Não! Até este momento não tinha a menor ideia que o meu pai andasse sem calças.
Holmes — Então como chegaram estas à sua posse?
Imogene — Esta manhã, senhor Holmes, atiraram um par, esse par de calças, por uma janela superior do Palácio Buckingham. Vi-as cair…
Watson — Holmes, Algum demónio que se dedica a roubar as calças no meio de Londres!
Holmes — Bem, Watson, não estou convencido de todo. Posso confirmar o que é evidente? (examina as calças com a lupa, depois dirige-se a Lady Imogene) — Palácio Buckingham, foi o que disse, não é verdade?
Imogene — Sim senhor Holmes. O meu pai foi lá para uma conferência com o novo embaixador francês, Monsieur Paradol, e sua Majestade, a rainha, creio. Acredito que se trata de um pacto secreto entre a França e a Grã-Bretanha. Pode imaginar a minha angústia, o meu terror, quando vi as calças voarem pela janela de sua majestade!
(Ouve-se um ruído lá fora)
Holmes — Rápido, Watson! Esconda a prova! (entrega as calças a Watson, que as esconde entre a casaca e a camisa, depois dirige-se para a porta)
Watson — Este não é um cliente corrente, Holmes.
Holmes — Fale claro, por favor!
Watson (abrindo a porta e curvando-se como um criado — Sua Excelência o Marquês de Paradol!
(Entra o Marquês de Paradol, de chapéu alto e casaco tipo imperial, olha para cada um e tira o chapéu)
Paradol — Senhores! Senhora! (curva-se)
Imogene (gritando) — O senhor veio aqui para clarificar o tremendo enigma do Palácio Buckingham?
Paradol (com feroz dignidade) — Vim aqui, senhora, para recuperar as minhas calças!
Holmes — Devemos entender que também as calças de sua excelência desapareceram?
Paradol — Não, não desapareceram. No Palácio Buckingham, na presença de sua Majestade, a rainha, roubaram-me as calças e atiraram-nas pela janela.
 
Watson — Não é possível!
Paradol — Sim, é certo. Tudo sucedeu num momento. Vi através de um espelho, seis homens mascarados e com barbas postiças, dirigirem-se para mim, ameaçadores. Cumpri o meu dever! Gritei “Viva a França” e fiquei sem calças!
Imogene — O senhor fez isso na presença de sua Majestade?
Paradol — Sinto muito. Ela lançou um grito tremendo e desmaiou sobre o sofá dourado. Devo pedir-lhe perdão, minha senhora!
Imogene — Não tem de pedir perdão por nada.
Paradol — Tenho de pedir-lhe perdão por haver tirado as calças a de seu pai! Eram de vital importância para a minha vida. Veja, senhora, tinha de vestir umas calças para poder sair.
Watson — Oh! Pioraram os serviços diplomáticos… porém, por que queriam esses miseráveis roubar-lhe as calças?         
Paradol — O senhor já ouviu falar do tratado Paradol— Matchlock entre Inglaterra e França?
Imogene — O tratado secreto, creio.
Holmes — O tratado secreto, segundo presumo, estava nas calças de Sua Excelência
Paradol (admirado) — Que homem! Que homem magnífico! Que dedução!
Holmes (retirando as calças escondidas em Watson) — Um esconderijo secreto de finíssimas lâminas de cobre ocultavam o tratado, que devolvo a Sua Excelência. (faz uma vénia).
Paradol (pegando nas calças) — Senhor! Em nome do meu governo, em meu nome e da França inteira eu … (detém-se e começa a examinar as calças nervosamente)
Imogene — Está nervoso, senhor Paradol? Será que não encontra o esconderijo secreto?
Paradol — O esconderijo, sim, mas o tratado desapareceu!
Imogene — Desapareceu?
Watson — Desapareceu?
Holmes — não tenha dúvidas, meu caro senhor. O tratado está nesta casa. Foi substituído por um ladrão e traidor!
Watson — Trata-se de Moriarty?
Holmes — Não se trata de Moriarty, não senhor. Trata-se do seu lugar-tenente o segundo homem mais perigoso de Londres… Está aqui! (arranca o bigode a Watson, que fica estupefacto).
Imogene — Então não é o senhor Watson?
Holmes — Não Lady Imogene, o verdadeiro Watson deve estar amarrado e amordaçado. Apresento-lhe o coronel Sebastian Moran.
O falso Watson — Maldito Holmes! Devia acabar consigo com uma bala!
Paradol — Mas como conseguiu suspeitar deste miserável?
Holmes — De uma maneira muito simples. Quando Sua excelência entrou e nomeou um facto que não era do conhecimento público, dei-me conta da classe de homem que me acompanhava e dei-lhe uma oportunidade para roubar o tratado. (Procura na roupa interior do falso Watson e recolhe, com expressão de triunfo, um documento que entregou a Paradol.
Paradol — A aventura do esconderijo de Paradol.
O falso Watson — Não, maldita seja “a aventura das calças de cobre”!
CAI O PANO

Sem comentários:

Enviar um comentário