13 de junho de 2012

CALEIDOSCÓPIO 165

EFEMÉRIDES – Dia 13 de Junho


Fernando Pessoa por Júlio Pomar


Fernando Pessoa (1988 - 1935)
Fernando António Nogueira Pessoa nasce em Lisboa, freguesia dos Mártires, no n.º 4 do Largo de S. Carlos. Morre em Lisboa Hospital de São Luís dos Franceses, em Lisboa, no dia 30 de Novembro de 1935.
(ver destaque)

Dorothy L. Sayers (1893 – 1957)
Dorothy Leigh Sayers nasce em Oxford, Inglaterra. È uma das primeiras mulheres a obter um grau académico na Universidade de Oxford. Tradutora, ensaísta, poeta e escritora de policiários. O seu primeiro livro Whose Body? tem como personagem central, Lord Peter Wimsey é publicado em 1923. Nos 20 anos seguintes escreve mais romances e short stories, com aquele detective amador aristocrata. Dorothy L. Sayers é reconhecida como uma das maiores escritoras de literatura policiária do séc. XX. Estão publicados em Portugal:
1 – Crime Perfeito (1949), Tipografia Rádio Renascença. Título Original: Unnatural Death (1927). Reeditado em 1949 pela Livros do Brasil, Nº28 Colecção Vampiro. É o 3º livro da série Lord Peter Wimsey.
2 – Qual Dos Cinco? (1949), Tipografia Rádio Renascença. Título Original: The Five Red Hearings (1931). Reeditado em 1949 pela Livros do Brasil, Nº22 Colecção Vampiro. É o 7º livro da série Lord Peter Wimsey.
3 – O Mistério No Bellona Club (1950), Nº35 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: The Unpleasantness At The Bellona Club (1928). Reeditado em 1995 pelas Publicações Europa América, Nº151 Colecção Clube do Crime com o título Morte No Clube Bellona. É o 5º livro da série Lord Peter Wimsey.
4 – O Crime Exige Propaganda (1952), Nº63 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: Murder Must Advertise (1933). Reeditado em 2005 pelo Publico, Nº5 Colecção 9 mm É o 10º livro da série Lord Peter Wimsey.
5 – Intriga E Veneno (1953), Nº74 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: Strong Poison (1930). Reeditado em 1994 pelas Publicações Europa América, Nº146 Colecção Clube do Crime, com o título Veneno Fatal. É o 6º livro da série Lord Peter Wimsey.
6– Revisão De Processo (1954), Nº37 Colecção Escaravelho de Ouro, Editora Édipo. Título Original: Documents In The Case (1930). Reeditado em 1996 pelas Publicações Europa América, Nº154 Colecção Clube do Crime com o título O Caso dos Cogumelos Venenosos.
7 – O Lord E O Desconhecido (1955), Nº45 Colecção Xis, Editora Minerva. Título Original: Whose Body? (1923). Reeditado em 1992 pela Edições 70, Nº34 Colecção Álibi - Os Clássicos do Policial com o título O Mistério de Battersea. É o 1º livro da série Lord Peter Wimsey.
8 – O Gato de Diamantes (1956), Nº112 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: Clouds With Witness (1926). Reeditado em 1995 pelas Publicações Europa América, Nº38 Colecção Crime Perfeito com o título Falsos Testemunhos. É o 2º livro da série Lord Peter Wimsey.
9 – A “Caixa” (1984), Edições 70. Título Original: The Scoop And Behind The Screen (1931). Em colaboração com outros escritores.
10 – Quem Matou o Almirante (1989), Nº500 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: The Floating Admiral (1932). Em colaboração com outros escritores.
11 – As Férias Do Carrasco (1989), Nº504 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: Hangman’s Holiday (1933). É o 9º livro da série Lord Peter Wimsey
12 – Premonição Assassina (1996), Publicações Europa América Nº157 Colecção Clube do Crime Título Original: Stridind Folly (1972). 3 Short stories de Lord Peter Wimsey.
13 – Doze Enigmas Para Um Detective (1997), Publicações Europa América Nº157 Colecção Obras de Dorothy L. Sayers Título Original: Lord Peter Views A Body (1928). É o 4º livro da série Lord Peter Wimsey
14 – Morte Dupla (1997), Nº605 Colecção Vampiro, Editora Livros do Brasil. Título Original: Double Death: A Murder Story (1939). Em colaboração com outros escritores.
15 – As Damas Do Crime - A Imagem No Espelho (2003), Nº2 Colecção Ler & Reler, Planeta Editora. Coletânea de contos de várias escritoras, inclui The Image In The Mirror (1932) de Dorothy L. Sayers

Rex Burns (1935)
Raoul Stephn Sehler nasce em Coronado, San Diego, Califprnia, EUA. Especialista em escrita criativa, professor universitário escreve 15 romances policiários entre 1975 e 1997, sob os pseudónimos Rex Burns e Tom Sehler. Cria os personagens Gabe (Gabriel) Wager do Departamento da Polícia de Denver e Devlin Kirk um detective privado, ex agente secreto, agora especializado em crimes de colarinho branco e de segurança industrial. O escritor recebe em 1976 o Edgar Award – Best First Novel com
The Alvarez Journal. Rex Burns é co autor com Mary Rose Sullivan do estudo Crime Classics The Mystery Story From Poe To The Present (1990).

TEMA — LITERATURA POLICIÁRIA — FERNANDO PESSOA, POTENCIAL ESCRITOR POLICIÁRIO
por M. Constantino
Tendo nascido em Lisboa, órfão de pai aos cinco anos, acompanhou a mãe, que contraíra segundo matrimónio com o cônsul português em Durban, na sua ida para a África do Sul, onde vive de 1895 a 1095. Fez estudos secundários no liceu de Durban, frequentou uma escola comercial e concluiu o Intermediate Examination in Arts. Na admissão à universidade, apenas com 15 anos (1903) ganhou o Queen Victoria Memorial Prize, prelo melhor ensaio de estilo inglês. Dos prémios a que teve direito escolheu The Choices Works of Edgar Allan Poe, denunciando o seu gosto pela literatura do género. Aliás confessa que na sua juventude, diria melhor meninice, “os livros que dormem junto à minha cabeceira, “numerosas novelas de mistério e horríveis aventuras”… Mais tarde deixa escrito que “Um dos poucos divertimentos intelectuais que ainda restam ao que ainda resta de intelectual na humanidade é a leitura de romances policiais. Entre o número áureo e reduzido das horas felizes que a Vida deixa que eu passe, conto por do melhor ano aquelas em que a leitura de Conan Doyle ou de Arthur Morrison me pega na consciência ao colo. Um volume de um destes autores, um cigarro de 45 ao pacote, a ideia de uma chávena de café — trindade cujo ser-uma é o conjugar a felicidade para mim — resume-se nisto a minha felicidade.”
Eis o pensamento de Pessoa.
De regresso a Lisboa, onde acaba por se fixar, ainda frequenta por um ano a Faculdade de Letras. É “empregado de Comércio”, segundo o bilhete de identidade que mais tarde altera para “escritor”. De facto escreve, escreve muito em jornais e revistas, em nome pessoal, e dos muitos heterónimos e “por trás das máscaras involuntárias do poeta, do raciocinador e do que mais haja…” — dos quais os mais destacados são Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro Campos e o inglês Alexander Search (William Alexander Search). Como este último escreve e publica em 1907 “A Very Original Dinner” — Um Jantar Muito Original, primeira tentativa de cariz policial ou policiário, termo que indica a Adolpho Casais Monteiro, por carta datada de 15/2/1935 e hoje assumido por muitos policiaristas. É com o nome Alexander Search que é sócio de Collins Crime Club e Albatross Crime Club que lhe garantem o envio dos livros policiais logo que fossem publicados, alguns são encontrados numa estante após a sua morte.
Em 1912 inicia uma série de “contos de raciocínio” (também Poe apelida os contos de Dupin nos mesmos termos) de que só publica “ O Banqueiro Anarquista”. A série de “novelas policiárias” projectadas, tais como O Caso Vargas (o mais adiantado), O Pergaminho Roubado, O Caso do Quarto Fechado, O Desaparecimento do Doutor Reis Dores, O Roubo na Quinta das Vinhas, O Caso da Janela Estreita, A Carta Mágica, O Roubo da Rua dos Capelinhos, e bastantes outros, ficam dispersos por alguns textos, apontamentos, capítulos, após a sua morte prematura.



As novelas policiárias estão reunidas no livro Fernando Pessoa — Quaresma, Decifrador. As Novelas Policiárias, editado em 2008 pela Assírio & Alvim.

Informações sobre o escritor e a sua obra em CASA FERNANDO PESSOA (clicar)

Obra literária disponível online — incluindo as novelas policiárias em “Ficções”: ARQUIVO PESSOA (clicar)


TEMA — CRIAÇÃO LITERÁRIA DE PESSOA — CONTO DO VIGÁRIO
Vivia há já não poucos anos, algures, num concelho do Ribatejo, um pequeno lavrador, e negociante de gado, chamado Manuel Peres Vigário.
Da sua qualidade, como diriam os psicólogos práticos, falará o bastante a circunstância que dá princípio a esta narrativa.
Chegou uma vez ao pé dele certo fabricante ilegal de notas falsas, e disse-lhe: «Sr. Vigário, tenho aqui umas notazinhas de cem mil réis que me falta passar. O senhor quer? Largo-lhas por vinte mil réis cada uma.». «Deixa ver», disse o Vigário; e depois, reparando logo que eram imperfeitíssimas, rejeitou-as: «Para que quero eu isso?», disse; «isso nem a cegos se passa.» O outro, porém, insistiu; Vigário cedeu um pouco regateando; por fim fez-se negócio de vinte notas, a dez mil réis cada uma.
Sucedeu que dali a dias tinha o Vigário que pagar a uns irmãos, negociantes de gado como ele, a diferença de uma conta, no valor certo de um conto de réis. No primeiro dia da feira, em a qual se deveria efectuar o pagamento, estavam os dois irmãos jantando numa taberna escura da localidade, quando surgiu pela porta, cambaleando de bêbado, o Manuel Peres Vigário. Sentou-se à mesa deles, e pediu vinho. Daí a um tempo, depois de vária conversa, pouco inteligível da sua parte, lembrou que tinha que pagar-lhes. E, puxando da carteira, perguntou se se importavam de receber tudo em notas de cinquenta mil réis. Eles disseram que não, e, como a carteira nesse momento se entreabrisse, o mais vigilante dos dois chamou, com um olhar rápido, a atenção do irmão para as notas, que se via que eram de cem.
Houve então a troca de outro olhar.
O Manuel Peres, com lentidão, contou tremulamente vinte notas, que entregou. Um dos irmãos guardou-as logo, tendo-as visto contar, nem se perdeu em olhar mais para elas. O Vigário continuou a conversa, e, várias vezes, pediu e bebeu mais vinho.
Depois, por natural efeito da bebedeira progressiva, disse que queria ter um recibo. Não era uso, mas nenhum dos irmãos fez questão. Ditava ele o recibo, disse, pois queria as cousas todas certas. E ditou o recibo — um recibo de bêbado, redundante e absurdo: de como em tal dia, a tais horas, na taberna de fulano, e «estando nós a jantar» (e por ali fora com toda a prolixidade frouxa do bêbado...), tinham eles recebido de Manuel Peres Vigário, do lugar de qualquer coisa, em pagamento de não sei quê, a quantia de um conto de réis em notas de cinquenta mil réis. O recibo foi datado, foi selado, foi assinado. O Vigário meteu-o na carteira, demorou-se mais um pouco, bebeu ainda mais vinho, e daí a um tempo foi-se embora.
Quando, no próprio dia ou no outro, houve ocasião de se trocar a primeira nota, o que ia a recebê-la devolveu-a logo, por escarradamente falsa, e o mesmo fez à segunda e à terceira... E os irmãos, olhando então verdadeiramente para as notas, viram que nem a cegos se poderiam passar.
Queixaram-se à polícia, e foi chamado o Manuel Peres, que, ouvindo atónito o caso, ergueu as mãos ao céu em graças da bebedeira providencial que o havia colhido no dia do pagamento. Sem isso, disse, talvez, embora inocente, estivesse perdido.
Se não fosse ela, explicou, nem pediria recibo, nem com certeza o pediria como aquele que tinha, e apresentou, assinado pelos dois irmãos, e que provava bem que tinha feito o pagamento em notas de cinquenta mil réis. «E se eu tivesse pago em notas de cem», rematou o Vigário, «nem eu estava tão bêbado que pagasse vinte, como estes senhores dizem que têm, nem muito menos eles, que são homens honrados, mas receberiam.» E, como era de justiça, foi mandado em paz.
O caso, porém, não pôde ficar secreto; pouco a pouco se espalhou. E a história do «conto de réis do Manuel Vigário» passou, abreviada, para a imortalidade quotidiana, esquecida já da sua origem.
Os imperfeitíssimos imitadores, pessoais como políticos, do mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba, a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso é com ternura que relembro o feito deste grande português, e me figuro, em devaneio, que, se há um céu para os hábeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe não deve ter faltado o acolhimento dos próprios grandes mestres da Realidade — nem um leve brilho de olhos de Macchiavelli ou Guicciardini, nem um sorriso momentâneo de George Savile, Marquês de Halifax.
(Publicado pela primeira vez na revista Sol, nº1. Lisboa: 30-10-1926. A segunda publicação foi no Notícias Ilustrado de 18-8-29, com o título “A Origem do Conto do Vigário”)


Fernando Pessoa por Almada Negreiros


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