2 de junho de 2012

CALEIDOSCÓPIO 154

EFEMÉRIDES – Dia 2 de Junho
 

TEMA — LITERATURA — FOLHETIM NA LITERATURA POPULAR
A literatura popular é a mãe da literatura, já que o saber, inclusivamente a literatura, iniciou-se e transmitiu-se pela oralidade. Antes da narrativa escrita, existia a oral, com o aparecimento da escrita começou o registo das obras fundamentais da civilização, desde o Poemas de Gilgamesh ao Livro dos Mortos — Egipto — à própria Bíblia. Existia literatura popular oral nos relatos do círculo homérico, posto em verso para conservação e difusão de memória em memória, o que requeria uma profícua e extensa dedicação, por sua vez comunicado à escrita.
A modernidade literária iniciou-se com o aparecimento da imprensa em 1445. Esta acabou com o predomínio do verso, já que a possibilidade de reproduzir um texto mediante um procedimento mecânico em numerosos e idênticos exemplares permitiu aos criadores, preocupar-se tão só com o destino da obra, prescindindo a estrutura métrica.
O apogeu da literatura de ficção novelística adquiriu uma maior difusão e um papel social relevante partir de 1770 sensivelmente, com a primeira revolução burguesa, em cujo curso o desenvolvimento capitalizou na Europa e na América a instrução pública e a alfabetização das massas. O número de leitores triplicou em Inglaterra onde as imprensas manuais tradicionais que imprimiam 200 folhas em uma hora foram substituídas em 1810 pela impressão mecânica de Koeni e Baver, que imprimiam 1000. Em 1812 foi aberta a primeira agência de informação. A venda de periódicos, se não dependia totalmente dos folhetins e outras formas de narração despertavam um vivo interesse no cliente. Com isto — um ciclo histórico — não queremos dizer que a oralidade acabou, já que surgem as representações orais radiofónicas, cinematográficas e televisivas, bem assim como a manutenção teatral, com fortes possibilidades de alcançar o futuro. O auge do folhetim r da novela por entregas corresponde a uma parte importante da narrativa europeia até no sec. XIX. Obras de Balzac, Dostoievski, Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Hugo Lamartine. Dumas etc… chegaram pela primeira vez ao alcance dos leitores por folhetins nos jornais ou por entregas, num regime que permitia reduzir substancialmente o custo. Muita gente do povo, a que sabia ler, recorria aos folhetins, mal impressos vendidos nos jornais ou fascículos, estes vendidos em feiras e mercados, por vezes de porta em porta.
A recolha dos temas era determinante: histórias de encantar, paixões atribuladas, amores secretos, eróticos, crimes horrendos, proezas de salteadores, prodígios mirabolantes, anedotário, fenómenos, almanaques, etc. correram por todos os países da Europa e América até ao séc. XX.
Portugal não fugiu à regra. A característica policiária surgiu nos quiosques em 1909. Por textos importados a “Novela Popular”, com “Aventuras Extraordinárias d’ um Polícia Secreta”, um Sherlock Holmes à mistura com outros personagens, “o único polícia francês, Raffles, Lord Lister, Nick Carter, o Máscara Negra, Texas Jack etc. Em a “Novela Moderna” é divulgada Miss Boston a única mulher polícia em todo o mundo. Mais tarde, pela mão de Repórter X, assinados por ele, ou por outros, tais como Américo Faria, Pedro Muriel, Mário Domingues, Ferreira de Castro, Guedes de Amorim, etc. apareceu “Novela Policial”.
Fica esta pequena nota, num assunto que daria centenas de páginas.
M. Constantino


TEMA — SHORT STORY — O ASSASSINO E A VÍTIMA
De M. Constantino
Os dedos de longas e afiadas unhas soltaram o último pedaço de terra. Um idêntico conjunto, qual garras, juntou-se antes de o corpo surgir das profundezas.
O rosto é fusco, de incisivos salientes, olhos amarelos, necrófilos.
Sentia-se fraco e sedento…
Ergueu-se.
À luz do luar que se espraia pela planura notou a solitária habitação.
Aproxima-se. O simples pensamento de se saciar retempera-lhe energias.
Anda à volta em busca de uma abertura. Janelas e portas sólidas, o próprio chão cimentado em volta, tornam a tarefa impeditiva.
Afasta-se. Procura em vão…
Quando o sol despertou, deitou-se à beira do carreiro de acesso à moradia… poderia surpreender um ansiado despojo. Acamou, oculto pela folhagem, sobre um velho livra de Bram Stoker. Numa página amarfanhada descobriu o desenho de uma jovem ensanguentada… sangue vermelho e brilhante expresso com toda a realidade… Preso de uma vertigem arrancou e mastigou, com deleite, pedaços de papel!
A vítima, tranquilamente, instalou-se num tronco próximo, usufruindo o calor matinal.
Ele não se mexeu. Os olhos fixos crispantes, observam…
Num salto brusco, atinge a vítima pela garganta. O sangue verte das mordeduras. Dentes amarelos, aguçados, sequiosos, sugam a presa que se debate, sacudindo o corpo esguio até quedar-se com um último estremecimento…
O assassino e a vítima; o rato do campo e a sardanisca ingenuamente descuidada.

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