21 de maio de 2016

2º EPISÓDIO - O RETIRO DO QUEBRA BILHAS de A. RAPOSO

Do Martim Moniz ao Campo Grande


Sesinando acordou com a boca a saber a papéis de música. Dormiu mal até às 3 da manhã.
Os quartos da pensão “Bons Sonhos” eram baratos – 15 escudos uma dormida, mas o quarto era minúsculo onde mal cabia o divã de molas e as paredes eram de tabique de madeira o que dava para se ouvir tudo o que se passava aos lados.
Estava convencido que a pensão mal dava tempo para sonhar pois as cabo-verdianas que faziam o Largo Martim Moniz entravam e saiam várias vezes e cabo-verdiano é assim, é expansivo na cama…
Sesinando não exigia mais pelos 15 paus. 
Lá pela madrugada adormeceu profundamente e agora já estava pronto para sair. Banho nem vê-lo. A pensão não tinha! Nem tampouco águas correntes  nem quentes nem frias. Era pegar ou largar. Pelo preço não se podia pedir mais. 
Divertiu-se fumar e a beber Sagres até às duas da manhã e a ouvir mornas e boleros tocados pelo ceguinhos-músicos do Bar “Bolero”. Não foi em engates.
Ainda era cedo. Havia muito tempo para a esbórnia. 
Vestiu-se e petiscou um copinho de leite na leitaria da esquina e seguiu o seu objetivo ir ver o lago dos barcos do Campo Grande e espreitar  e eventualmente almoçar no retiro do “Quebra Bilhas”.
Alguém lhe falara da casa. Com mesas de correr e um caramanchão a sombrear e refrescar o ambiente. Comida caseira e bom vinho da pipa.
Estava danadinho para comer umas iscas com elas, um prato do seu agrado e que não o via há mais de dois anos!
E lá foi o nosso alferes Sesinando a pé  agora já à civil, pela Almirante Reis acima até ao Areeiro e depois Avenida de Roma até ao Campo Grande.

Almirante Reis
Fonte: Urban Sketchers
A cidade mudara muito e a parte nova era de arquitetura moderna. O arranha-céus do Areeiro, com a sua dúzia de andares era o edifício mais alto da cidade. Matarruano que visitasse Lisboa tinha que ir espreitar o edifício e também ao Jardim Zoológico ver os animais exóticos.

Chegou ao Jardim do Campo Grande e foi ver o lago onde os pequenos botes a remos eram o prazer máximo dos namorados.


Campo Grande
Fonte: 
Urban Sketchers
Ali ficou sentado num banco de jardim a fumar e a gozar da boa vida quando de repente e sem dar por isso um cãozinho veio ladrar às suas botas. Era uma amostra de cão. Mal se via o focinho cheio de pelos bem como o corpo. Parecia um novelo de lá a ladrar-lhe aos pés. 
Afogueada atrás do canito vinha a dona. Chamando-o pelo nome e ele sem obedecer, pois embirrara com as botas do nosso alferes.
Sesinando, num golpe de rins, agarrou na trela solta e puxou-o. De seguida a dona a deitar os bofes fora chegou ao alferes e agradeceu.
− Ai, muito obrigado. Este malandro de repente foge-me e atravessa a rua. É um perigo. Não sei como lhe hei de lhe agradecer.
− Ora − disse Sesinando − não me custou nada apanhar o bichinho. Pode-me agradecer dizendo-me o seu nome?
− Milú. E o cãozinho chama-se Lanudo.
Sesinando pediu-lhe para ela descansar um bocadinho, ali no banco do jardim havia lugar para todos e sobrava espaço.
Estava-se a preparar um começo de uma bela amizade. Quase ia apostar.


(fim do 2º episódio) 

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