Do Martim Moniz ao Campo Grande
Sesinando acordou com a boca a saber a papéis de música. Dormiu mal até às 3 da manhã.
Os quartos da pensão “Bons Sonhos” eram baratos – 15 escudos
uma dormida, mas o quarto era minúsculo onde mal cabia o divã de molas e as
paredes eram de tabique de madeira o que dava para se ouvir tudo o que se
passava aos lados.
Estava convencido que a pensão mal dava tempo para sonhar
pois as cabo-verdianas que faziam o Largo Martim Moniz entravam e saiam várias
vezes e cabo-verdiano é assim, é expansivo na cama…
Sesinando não exigia mais pelos 15 paus.
Lá pela madrugada adormeceu profundamente e agora já estava
pronto para sair. Banho nem vê-lo. A pensão não tinha! Nem tampouco águas
correntes − nem quentes nem frias. Era pegar ou largar. Pelo preço não se podia
pedir mais.
Divertiu-se fumar e a beber Sagres até às duas da manhã e a
ouvir mornas e boleros tocados pelo ceguinhos-músicos do Bar “Bolero”. Não foi
em engates.
Ainda era cedo. Havia muito tempo para a esbórnia.
Vestiu-se e petiscou um copinho de leite na leitaria da
esquina e seguiu o seu objetivo ir ver o lago dos barcos do Campo Grande e
espreitar − e eventualmente almoçar no retiro do “Quebra Bilhas”.
Alguém lhe falara da casa. Com mesas de correr e um
caramanchão a sombrear e refrescar o ambiente. Comida caseira e bom vinho da
pipa.
Estava danadinho para comer umas iscas com elas, um prato do
seu agrado e que não o via há mais de dois anos!
E lá foi o nosso alferes Sesinando a pé − agora já à civil,
pela Almirante Reis acima até ao Areeiro e depois Avenida de Roma até ao Campo
Grande.
Almirante Reis Fonte: Urban Sketchers |
Chegou ao Jardim do Campo Grande e foi ver o lago onde os
pequenos botes a remos eram o prazer máximo dos namorados.
Campo Grande Fonte: Urban Sketchers |
Ali ficou sentado num banco de jardim a fumar e a gozar da
boa vida quando de repente e sem dar por isso um cãozinho veio ladrar às suas
botas. Era uma amostra de cão. Mal se via o focinho cheio de pelos bem como o
corpo. Parecia um novelo de lá a ladrar-lhe aos pés.
Afogueada atrás do canito vinha a dona. Chamando-o pelo nome
e ele sem obedecer, pois embirrara com as botas do nosso alferes.
Sesinando, num golpe de rins, agarrou na trela solta e
puxou-o. De seguida a dona a deitar os bofes fora chegou ao alferes e
agradeceu.
− Ai, muito
obrigado. Este malandro de repente foge-me e atravessa a rua. É um perigo. Não
sei como lhe hei de lhe agradecer.
− Ora − disse Sesinando − não me custou nada apanhar o
bichinho. Pode-me agradecer dizendo-me o seu nome?
− Milú. E o
cãozinho chama-se Lanudo.
Sesinando pediu-lhe para ela descansar um bocadinho, ali no
banco do jardim havia lugar para todos e sobrava espaço.
Estava-se a preparar um começo de uma bela amizade. Quase ia
apostar.
(fim do 2º episódio)
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